CÓLERA EM MOÇAMBIQUE
Conhecimento para melhorar o abastecimento de
água
19 de Março de 2015
Conscientização da comunidade é um
dos fatores fundamentais para deter o surto de cólera no país.
Melhorias na água e no saneamento
são essenciais para deter a cólera, uma doença transmitida pela água. Em
Moçambique, onde um surto atual já matou 46 pessoas e afetou mais de 5 mil, de
acordo com estatísticas oficiais, equipes da organização humanitária
internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) estão trabalhando para melhorar a
situação. Mas isso requer mais do que uma solução rápida e técnica.
“O que é que você quer? Construir
uma estação de tratamento de água ou ter pessoas usando-a?”, pergunta Eveline.
As botas de borracha ásperas e as
vestimentas já empoeiradas da MSF podem não estar gritando “missão
diplomática”, mas a tarefa desta manhã é mais ou menos essa: entender,
conversar, explicar e convencer os líderes locais sobre como derrotar a cólera.
No centro de tratamento de cólera de
Tete, tem havido um influxo crescente de pacientes vindos de Chimadzi, um
grande bairro no meio do caminho entre uma favela urbana e um grande vilarejo.
Um surto de cólera significa
abastecimento de água inseguro e higiene e saneamento precários; então “o
pessoal de água e saneamento”, como o especialista Mihail Papageorgiou,
desempenham um papel decisivo na resposta à epidemia. Ele já sabe o que deve
ser construído na região: uma unidade de tratamento de água que irá absorver a
água do rio mais próximo, torná-la potável e depois distribuí-la, de graça, às
três mil famílias que vivem ali. “Esse sistema centralizado de tratamento de
água é feito para uma resposta rápida.
Nós poderíamos ter chegado com 20
profissionais e, em três horas, teríamos feito a parte manual. Esse componente
físico da resposta – montar o sistema de tratamento de água mais apropriado – é
principalmente uma questão técnica, e que pode ser resolvida rapidamente.
Mas o verdadeiro desafio está em
tentar melhorar o entendimento dos usuários e o uso correto desse sistema. Você
pode estar produzindo a água mais limpa do mundo, mas se a comunidade para a
qual você está fazendo isso não confia no sistema ou o utiliza de maneira
errada, o impacto dessa resposta na cadeia de saúde é pequeno. Ali, as equipes
de promoção de saúde desempenham um papel fundamental. “Queremos deixar
informação e educação aqui depois de partirmos, e não uma bagunça, então
levar mais tempo”, diz ele.
Enquanto Mihail Papageorgiou e o
logístico Iain Watermeyer examinam a bomba de água da região – uma possível
fonte de água contaminada – a oficial de promoção de saúde da MSF, Eveline
Cleynen, conversa com os líderes locais com uma criança pequena do bairro
agarrada no seu quadril. Manuel Faquero, o líder local, concorda em marcar uma
reunião para falar e explicar os processos para a comunidade. “Eu tentarei
convencê-los, mas é difícil mudar hábitos”, diz ele.
A cólera é uma doença transmitida
pela água. Se você tem cólera, bebeu água contaminada ou não tem respeitado
medidas simples de higiene pessoal, como lavar as mãos. Pare de beber água
contaminada. Lave suas mãos regularmente. Parece simples.
Mas muitos factores estão envolvidos:
hábitos, práticas, falta de informação, desconfiança acerca da mensagem – seja
vinda de profissionais de ONGs ou do governo.
Há uma enorme diferença entre falar
às pessoas o que fazer e mostrá-las que você está disposto a tentar entender a
situação. É importante provar e beber a água quando criar um sistema de
tratamento de água do ponto de colecta, como a cloração utilizando balde. Isso
demonstra claramente que o cloro que estamos adicionando não faz mal à saúde e
não vai transmitir cólera, como se pensa às vezes.
Nós descemos em direção ao rio
Chimadzi, que corre a cerca de 10 metros da bomba. É largo e raso: algumas
centenas de metros de largura, mas apenas alguns centímetros de água corrente.
Mulheres estão lavando suas roupas; crianças pulando completamente nuas; uma
carroça puxada por um burro passa por ali. O leito do rio tem buracos onde as
pessoas coletam sua água: a areia actua como filtro natural, e a água ali é
cristalina, mas exposta a todos os tipos de contaminação por água residual ou
sujeira. Mikhaelis termina a sua colecção de amostras, e pergunta qual água as
pessoas preferem beber.
Agora começa a fazer sentido: a água
da bomba é ligeiramente salgada e a do buraco no rio tem gosto de água. Não é
de se admirar que as pessoas prefiram essa. Algo para se manter em mente quando
o centro de tratamento de água estiver concluído.
Uma vez que os primeiros litros de
água tratada começarem a sair do sistema, a bola está com a equipe de promoção
de saúde e os líderes locais. Haverá reuniões, perguntas e, com sorte, haverá
mudanças. Pelo menos, até que o surto termine.
A MSF
está respondendo ao actual surto de cólera em Moçambique desde Fevereiro deste
ano. A organização construiu e coadministra com o Ministério da Saúde de
Moçambique (MISAU) dois grandes centros de tratamento de cólera em Tete (200 camas),
actual foco da epidemia, e Moatize (60 camas), ambos actualmente operando com
capacidade máxima.
Fontes:
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