CARTA DO REI LEOPOLDO II DA BÉLGICA AOS CRISTÃOS EM ÁFRICA
Por RM Kuyeri, 26 de Abril de 2019

A história da colonização portuguesa regista que, após a instauração da Primeira República Portuguesa, em 1910, as relações entre a Igreja Católica e Portugal rapidamente se deterioraram, ao ponto de Portugal cortar as suas relações diplomáticas com a Santa Sé, devido a conflito de interesse em África entre a Santa Sé e Portugal.

Logo a partir de Outubro de 1910, os dirigentes republicanos de Portugal adoptaram uma série de medidas anticlericais, sendo o exemplo mais evidente a Lei da Separação da Igreja e do Estado, de 20 de Abril de 1911, que proibiu a realização de cultos públicos sem prévia autorização das autoridades competentes do Estado português, bem como procedeu a nacionalização de todos os bens da Igreja, inclusive os templos.

A subida ao poder de Sidónio Pais, após o golpe de Dezembro de 1917, este procurou amainar as desinteligências em torno da questão religiosa e tentou refrear as medidas consideradas mais gravosas por via da sua eliminação unilateral. Mesmo assim, as relações entre Portugal e a Santa Sé ainda não tinham sido bem definidas através de um acordo de mútuo interesse e global, suscitando-se ainda mais as questões relacionadas com a lei da separação entre a Igreja Católica e o Estado português, promulgada em Abril de 1911, bem como de algumas medidas anticlericais adoptadas por Portugal.

Já com a subida ao poder de António de Oliveira Salazar e a implantação do Estado Novo, houve várias conversações preliminares iniciadas em 1937. Foi um longo e complexo processo negocial que teve em vista a criação de um sistema bem definido e estável das relações Estado-Igreja, tanto em Portugal como, com particular destaque, nas chamadas suas colónias ultramarinas em África como Moçambique, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, onde a Igreja tinha muitas missões exploratórias e de evangelização.

Este processo culminou com a assinatura da histórica Concordata entre Portugal e a Santa Sé, no dia 7 de Maio de 1940, que viria a oficializar as relações entre as duas partes. Foi um tratado bilateral que atribuiu um conjunto significativo de privilégios e benefícios à Igreja Católica, religião tradicional de Portugal, como da maior parte da Europa, independentemente de terem evoluído novas seitas que se tornaram em novas religiões cristãs.

Embora a Constituição portuguesa de 1933 consagrasse o princípio da liberdade de culto e de religião, era amplamente reconhecido pelos apoiantes do regime nacionalista de Salazar que a Igreja Católica era a religião tradicional da Nação portuguesa, por isso só ela tinha o direito de ensinar nas escolas públicas, a isenções fiscais e a definir o seu próprio sistema de organização. Mas este direito da Igreja Católica não era uniforme nas colónias ultramarinas portuguesas em África, cuja observância e realização dependia de nuances específicos.

Assim, a Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa de 1940 foi assinada no dia 7 de Maio de 1940, durante o papado de Pio XII e o Governo de António de Oliveira Salazar que, no essencial e para Moçambique, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, estabelecia o princípio de que “um dia os pretos de África vão entender a ligação entre a religião e a politica… Um dia...”, como veio a acontecer.

Mas isso não foi mera novidade entre a Santa Sé e Portugal no que se refere à engenharia europeia de colonização do continente africano. Pois, muito antes, houve uma carta de Leopoldo II da Bélgica aos missionários Cristãos em África que bem definia qual era o propósito e a missão das expedições missionárias para África. No caso das colónias ultramarinas de Portugal em África, a Concordata de 1940 se traduzia no seguinte: “Ensinar aos pretos a ler a Bíblia e a entender e melhor implementar as ordens e instruções dos seus patrões brancos”.

Mas voltemos ao século anterior, muito especial em 1883. A carta que se segue é cortesia do Dr. Vera Nobres e Dr. Chiedozie Okoro. Trata-se da Carta do Rei Leopoldo II da Bélgica para os Missionários das suas colónias, escrita em 1883:

Reverendos Padres
Queridos Compatriotas,

A tarefa que vos será dada a cumprir é muito delicada e requer muito tacto. Vocês vão para evangelizar, mas a vossa evangelização deve aspirar todos os interesses da Bélgica.

O vosso principal objectivo na nossa missão no Congo nunca será de ensinar os negros a conhecerem a Deus. Isso eles já sabem. Eles falam em se submeterem a Mungu, a Nzambi, a Nzakomba, e o que mais eu não sei. Eles sabem que matar, dormir com a esposa de outro homem, é um insulto, é mau.

Tenham coragem de admitir que vocês não estão indo para ensinar o que eles já sabem. O vosso papel é essencialmente para facilitar a tarefa dos administradores industriais. O que significa que vocês vão a África para interpretar o evangelho da melhor forma possível de proteger os nossos interesses. Por isso, vocês têm a missão de garantir que os negros se distraíam com a palavra de Deus que nós queremos lhes transmitir para que não tenham nenhum interesse pelas riquezas dos seus solos. Eles jamais podem se interessar pelo ouro, pelos diamantes. Por isso, vocês devem mantê-los a lutar entre eles para agradarem a vocês, eles devem sonhar ser como nós e se matarem perpetuamente para nos agradarem.

O vosso conhecimento do evangelho vos permitirá encontrar textos adequados para recomendar aos negros e encorajar os seus seguidores a amar a pobreza indefinidamente. As passagens como: ‘Felizes são os pobres, porque eles herdarão o Reino dos Céus’, devem ser o seu dia-a-dia na maneira de pensar e viver. Incutam neles a percepção de que: ‘É muito difícil um rico entrar no reino de Deus do que um pobre’. Vocês têm de os separar e fazê-los desrespeitar tudo aquilo o que lhes dá coragem para nos afrontarem, amaciando os seus corações para os tornar cada vez mais mansos e obedientes às nossas ordens.

Faço referência ao seu sistema místico e à sua protecção. Vocês devem convencê-los a abandonar o ódio aos brancos, a odiar e a perseguir os seus sistemas místicos e às suas religiões de protecção, alegando que apenas a nossa religião pode lhes levar aos céus. Vocês devem fazê-los acreditar que a sua religião é feitiçaria e é contra o nosso Deus verdadeiro, assim eles próprios se encarregarão de perseguir e destruir as suas religiões.

A vossa acção será dirigida essencialmente para os mais jovens, para que eles não se revoltem quando a recomendação do sacerdote for contraditória aos ensinamentos dos seus pais. As crianças têm de aprender a obedecer o que o missionário recomenda. Por isso, deverão aprender que o missionário é o pai das suas almas. Vocês deve insistir sempre na sua total submissão e obediência, evitar o desenvolvimento do espírito de revolta nas escolas, ensinar os alunos a ler e não à ter razão.

Meus queridos patriotas,

Estes são alguns dos princípios que devem orientar a vossa acção em África e devem ser aplicados. Vocês vão encontrar muitos outros livros, que serão dados a vocês no final desta conferência para melhor desempenharem a vossa missão em defesa dos nossos interesses em nome de Deus”.

Portanto, mais do que a propalada missão civilizadora e de evangelização divina em África, a Igreja Católica veio, esteve e continua ao serviço do colonizador até aos dias de hoje, mesmo com clérigos pretos, que são aqueles que aceitaram e assumem dar continuidade às recomendações do Rei Leopoldo II da Bélgica e da Concordata de 1940, assinada entre Portugal e a Santa Sé.

Segundo o Rei Leopoldo II da Bélgica e a Concordata de 1940, os clérigos devem evangelizar os negros para que eles fiquem para sempre na condição de submissão aos colonizadores brancos, para que eles nunca pensem em revoltar-se contra as restrições a que estão submetidos. Daí que o Rei Leopoldo II da Bélgica apregoe:

Recitem-lhes todos dias: ‘Felizes são aqueles que estão chorando, felizes são os pobres, porque deles é feito o Reino de Deus’.

Conversem sempre com os negros usando o chicote para que reconheçam a vossa autoridade por via do medo. Mantenham as suas mulheres longe, por nove meses após a sua apresentação, para trabalharem livremente para nós. Devem forçá-los a pagar-vos em espécies como sinal de reconhecimento: cabras, frangos ou ovos, toda a vez que vocês visitarem as suas aldeias certifiquem-se de que nenhum negro se enriqueça.

Cantem-lhes todos os dias que é impossível um rico entrar no céu. Façam-lhes pagarem o imposto a cada semana na missa de domingo, de modo a que não façam economias nas suas casas. Usem o dinheiro, supostamente para os pobres, para construir centros de florescentes negócios e instituam um sistema confessional que vos permita serem bons detectives, denunciando qualquer preto que tenha uma consciência diferente ou contrária do que a do tomador de decisões, que somos nós os brancos.

Ensinem os negros a esquecerem os seus heróis e venerarem só os nossos. Nunca ofereçam um assento cómodo a um preto que vos visitar. Não lhe dê mais do que um cigarro. Nunca o convidem a comer à vossa mesa, mesmo que ele vos dê um frango cada vez que ele vier a vossa casa”.

Este discurso do Rei Leopoldo II da Bélgica, tal como a Concordata de 1940, mostram a real intenção das viagens missionárias cristãs em África que foi exposta ao mundo pelo deputado Moukouani Muikwani Buko.

Meus irmãos,

Se a humanidade começou em África e está provado, não deveríamos ser os primeiros a saber sobre Deus? É hora de nos libertarmos da escravidão religiosa. Pois, primeiro, temos de nos livrar dessas estranhas religiões, crenças, deuses e contos de fadas dos europeus, trazidos para África para nos escravizar material e espiritualmente.

Nós todos sabemos que os nossos antepassados sabiam sobre os nossos deuses e a história, bem como a ciência, testemunham que a humanidade começou em África, que Adão e Eva nasceram em África, que Jesus Cristo era preto, como atestam as evidências. Então, porquê apostamos numa fé que não nos pertence?

Abandonemos a insensatez de continuarmos a seguir estupidamente a falsa fé dos outros como se fossemos cegos, para nos nos livrarmos dessas insanidades e desta escravidão. Nenhuma religião estranha nos libertará para além de nos ridicularizar, a exemplos destes falaciosos pregadores como o Pastor Honório que disse a uma mulher, em pleno culto, que ela não tinha filhos porque os testículos do seu marido eram de tamanhos diferentes. Que ridículo! Qual é o homem ou animal macho que tem testículos iguais? Não existe. Se existir, esse homem ou animal macho é anormal.

Meus irmãos, tal como a genética o fez em “A procura do ADN de Adão”, voltemos a traçar os nossos próprios passos até aos tempos dos nossos antepassados, às primeiras pessoas, elas devem ter os verdadeiros contos sobre os nossos deuses. Se algum deles existir, vamos segui-lo sem complexos nem tabus. Certamente que existirá alguém com esse conhecimento acima de qualquer homem e a história nos diz que eles tinham conhecimento e mitologias de deuses. Portanto, é preciso acreditar num Deus genuinamente nosso, de modo a retornarmos aos deuses reais dos nossos ancestrais e não ser escravos de outros homens como o Bispo Edil Macedo da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD)!

Falando da IURD, o único mérito do Edil Macedo é a sua sinceridade estampada na parede do seu Cenáculo Maior defronte da Av. 24 de Julho, na cidade de Maputo: “Aqui se evoca o Deus Vivo”. Quem? O homem, Edil Macedo. Ele é único Deus Vivo nos nossos dias.

Uma vez feito isso, todos podemos retornar à nossa africanidade e lá nos unirmos e redefinir as nossas vidas e caminhos, quebrando todos esses sistemas de escravidão material e espiritual que continuam a colonizar-nos. Lutemos por ser homens e mulheres verdadeiramente independentes e livres.

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