É ALTURA DE FALAR SOBRE O QUE NÓS FAZEMOS ENQUANTO JORNALISTAS E SOBRE O QUE FAZEM OS MINISTROS DA PROPAGANDA
Joana Azevedo Viana, In: Expresso, 13.01.2017 às 8h00

O dossiê escandaloso sobre Donald Trump, que afinal pode ser um escândalo jornalístico mas que também pode ser ambos ou nenhum - depende do ponto de vista e dos próximos dias, porque o debate está a arder e os factos estão em mutação - deixou a América nervosa e partida. Está tudo a ser posto em causa: os jornalistas, os serviços secretos, a verdade e a mentira.

Existe uma pequena indústria de empresas de investigação privada em Washington, na sua maioria compostas por ex-jornalistas e ex-funcionários de agências de segurança cujo trabalho passa por apurar informação sobre políticos que os políticos gostariam de manter em segredo. Muitas vezes, aponta o “The Guardian”, essas empresas não sabem quem está a contratar os seus serviços: a encomenda pode vir, por exemplo, de uma sociedade de advogados que representa um determinado cliente anónimo, como acontece nos esquemas de evasão fiscal denunciados por recentes investigações jornalísticas transnacionais (Panama Papers e Football Leaks).

No caso das mais recentes alegações sobre Donald Trump e as suas ligações ao governo de Vladimir Putin, o pedido para que se desenterrassem “podres” sobre Trump veio de um dos seus rivais republicanos durante as primárias do partido. Quando uma dessas empresas subcontratou os serviços de outra firma para investigar o empresário, Trump já tinha derrotado todos os candidatos na corrida partidária. O caso ia morrer ali, ainda antes de começar, mas entrou em cena um novo cliente, ligado ao Partido Democrata - isto não quer necessariamente dizer que a investigação tenha sido encomendada pela equipa de Hillary Clinton ou pelo seu partido; muitas vezes estes trabalhos são financiados por pessoas endinheiradas que já doaram tudo que podiam ou queriam a determinado candidato político e que estão à procura de outras formas de o ajudar.

Em julho, o dono dessa firma subcontratada - que o “Wall Street Journal” identificou ontem como Christopher Steele, um ex-espião do MI6 que fundou a Orbis Business Intelligence Ltd. para executar, a partir de Londres, trabalhos privados da mesma natureza - já tinha em sua posse uma quantidade significativa de material com base em fontes russas que confiavam nele, uma rede de contactos que foi montando enquanto agente do MI6 infiltrado em Moscovo e mais para oeste, em São Petersburgo.
 
A gravidade do que apurou assustou-o. Se os dados que tinha recolhido e que compilou no já famigerado “dossiê Trump” fossem verdadeiros, as suas implicações eram estrondosas. Por essa razão, decidiu entregá-los ao FBI para que a agência federal dos EUA apurasse a veracidade do conteúdo e decidisse o que fazer com ele. O “The Guardian” diz que o dossiê também foi entregue aos serviços de informação do Reino Unido mas que as autoridades britânicas ficaram tão constrangidas com o que leram que deixaram para os americanos a tarefa exclusiva de investigar o caso e tirar as suas próprias conclusões.

Por esta altura, quem segue a política norte-americana já saberá que o dossiê é um documento a três tempos que contém dados explosivos sobre o Presidente eleito. Nele, fontes russas garantem que a equipa de Trump manteve “contactos diretos e recorrentes” com intermediários do Kremlin ao longo da campanha presidencial. Mais do que isso, as fontes dizem que Putin está “há vários anos” a preparar Trump para a Casa Branca, ao mesmo tempo que o FSB (ex-KGB), sob as suas ordens, tem estado a reunir informações comprometedoras sobre o empresário que possam usar contra ele.

À medida que o tempo foi avançando, o autor do relatório começou a ficar preocupado. O FBI já lhe tinha pedido mais informações, mas continuava sem reagir e sem confirmar se o que as fontes diziam era verdade. Em vez disso, a agência federal liderada por James Comey centrava-se no alegado escândalo de emails de Hillary Clinton, por ter usado um servidor privado enquanto secretária de Estado no primeiro mandato de Obama. No final de outubro, quando faltavam apenas 11 dias para a ida às urnas, Comey veio a público anunciar que os seus agentes iam examinar novo material descoberto no âmbito dessa investigação. Hoje acumulam-se evidências de que a derrota de Hillary foi também causada pela decisão de Comey questionar a idoneidade da rival de Trump quando, acabaria por se comprovar, não havia indícios de crime que justificassem uma nova investigação à candidata democrata.

Mais ou menos por essa altura, e confrontado com a inação do FBI, o protagonista desta trama à James Bond foi instado durante uma viagem a Nova Iorque a contar a sua história a David Corn, editor da revista “Mother Jones”, que a 31 de outubro noticiou pela primeira vez a existência do material escabroso sobre Trump. O FBI continuava então a recusar-se a comentar o assunto, embora tenham surgido rumores de que pediu - e que terá conseguido obter junto do FISA (o tribunal de vigilância e serviços de informação dos EUA) - um mandato para aprofundar a sua investigação ao caso.

Em meados de novembro, já depois de Trump ser eleito, os documentos mantidos no segredo dos deuses da informação foram parar aos corredores de Washington - o que em última instância terá levado os diretores do FBI, da CIA, da NSA e o supervisor de todas essas agências a decidirem, há uma semana, informar Obama e Trump do conteúdo do dossiê. (Trump e a sua diretora de campanha, Kellyanne Conway, garantem que as secretas nunca lhe falaram de tal documento.)

Não se sabe quem vazou os documentos aos legisladores e jornalistas, mas sabe-se que isso terá acontecido porque o senador republicano John McCain foi apresentado a um diplomata ocidental que já tinha visto o dossiê, que conhecia a fonte, que a considerava credível e que o alertou para as perigosas ligações de Trump à Rússia. O encontro deu-se a 18 de novembro no Fórum Anual de Segurança Internacional em Halifax, no Canadá. McCain achou que as alegações eram alarmantes o suficiente para enviar um seu homem de confiança ir ter com essa fonte e descobrir mais pormenores. Foi dito a esse emissário do republicano que procurasse um homem com uma cópia do “Financial Times” debaixo do braço numa cidade que o “The Guardian” se comprometeu a não revelar. Em 24 horas, o homem estava de regresso e reunido com McCain, a quem mostrou os documentos e a quem disse que a informação era impossível de verificar sem uma investigação séria e aprofundada.

O republicano, inicialmente relutante em envolver-se no potencial escândalo, acabaria por decidir encontrar-se a sós com Comey para lhe entregar os documentos a 9 de dezembro, um mês depois das eleições. O circo só pegaria fogo, e não por decisão do chefe do FBI, esta semana, quando a CNN noticiou a existência do dossiê e o BuzzFeed publicou as 35 páginas secretas na íntegra. “Após examinar os conteúdos, e incapaz de apurar o seu rigor, entreguei a informação ao diretor do FBI. O meu contacto com o FBI ou qualquer outra agência governamental sobre este assunto acabou aí”, garantiu o senador em comunicado na quarta-feira.

Há um coro de críticas ao BuzzFeed e ao seu diretor, Ben Smith, por ter decidido divulgar o conteúdo do dossiê sem antes comprovar que o que é dito é verdade. No “New York Times” (NYT), Max Boot, do Council on Foreign Relations, escrevia quarta-feira que “é preocupante que o material tenha sido publicado quando outras grandes organizações de media, que não gostam particularmente de Trump, se recusaram a fazê-lo por não conseguirem verificar as alegações”. Para o colunista, “o BuzzFeed cometeu um sério erro ao simplesmente publicar online toda esta informação não substanciada, ignorando a prática jornalística de investigar e corroborar”. Publicar o material, defende ainda, é “prejudicial porque a natureza questionável do dossiê pode ser usada para impugnar a credibilidade da comunidade de serviços secretos americana, apesar de não ter sido ela a fonte”. No “Washington Post”, a colunista Margaret Sullivan, antiga diretora do NYT, acrescentou que, “numa era em que a confiança nos media já anda pelas ruas da amargura, isto não veio ajudar absolutamente nada”.

Há quem não concorde e tenha saído em defesa da decisão de Smith, a começar pelo jornalista veterano Carl Bernstein, um dos dois autores da investigação ao escândalo de Watergate, que levou à queda de Richard Nixon, e coautor do artigo da CNN que veio agitar, não só as águas de Trump, como as da profissão jornalística. “Vamos falar sobre o que é fazer jornalismo”, declarou num debate organizado pelo canal sobre quem se portou bem e portou mal nesta história. “Obter a melhor versão disponível da verdade. É isso que é uma história, e a melhor versão disponível da verdade é que os chefes das secretas dos Estados Unidos da América viram este material, consideraram que merecia investigação, consideraram que o Presidente dos EUA e o Presidente eleito deviam ser alertados. Aquilo a que estamos a assistir aqui esta noite é a uma desconstrução do processo jornalístico. Nós fizemos o nosso trabalho e vocês podem desconstruí-lo.”

Richard Tofel, diretor da agência de jornalismo de investigação ProPublica, foi ainda mais longe. “O que mudou quarta-feira foram duas coisas”, escreveu no Twitter. “Aprendemos que os serviços secretos consideram o dossiê importante o suficiente para informar Trump e Obama e que uma importante organização de media [a CNN] noticiou o facto e os pontos centrais apresentados no dossiê, mesmo sublinhando que eles continuam por verificar. Por causa disso, o dossiê tornou-se foco de debate público. O que restava era [decidir] se os que debatem devem ou não poder conhecer o que estão a debater. Além disso, a publicação [integral pelo BuzzFeed] vai provavelmente acelerar a descoberta sobre o que é verdade e o que é mentira no dossiê. É isso que deveríamos desejar.” É isso que até os que criticam o BuzzFeed desejam. Na sua coluna, Boot chega até a concordar com Tofel quando escreve que “só porque as alegações não foram comprovadas não quer dizer que sejam falsas”.
 
Para Trump são. Antes da sua conferência de imprensa de quarta-feira, a primeira em mais de seis meses, o Presidente eleito recorreu a letras maiúsculas no Twitter, como vem sendo costume, para expressar a sua frustração e questionar se acaso “estamos a viver na Alemanha nazi”. Já no encontro com os jornalistas, voltou a acusar as agências de informação do seu país de recorrerem a táticas nazis e cortou a palavra ao correspondente da CNN, gritando-lhe que faz parte dos “media falsos”. Pouco depois, o jornalista acabaria por denunciar, em direto no canal, que um assessor de Trump lhe foi dizer: “Mais uma destas e és expulso das conferências”. O seu delito? Tentar colocar questões ao homem que está prestes a tomar posse como Presidente de uma democracia.

Um dos artigos mais replicados pelos media nos últimos dias refere a ironia de Trump se sentir vítima de alegações por comprovar quando muita da sua campanha lucrou com alegações por comprovar que visavam Hillary Clinton. Algumas, senão muitas delas, terão sido alimentadas e disseminadas pela chefe de comunicações de Trump, a julgar pelas acusações diretas de Bernstein quarta-feira à noite. “Uma das grandes fontes anónimas da nossa era é Kellyanne Conway. Ela fá-lo todos os dias, ela tem sido uma fonte anónima em particular nos últimos dez meses, na campanha, quando lhe convém. É altura de falar sobre o que nós fazemos enquanto jornalistas e sobre o que fazem os ministros da propaganda, é isso que ela é, uma ministra da propaganda.”

Urge uma viagem ao fim de semana passado, quando o dissidente russo e campeão de xadrez Gary Kasparov notou, depois da trica do Presidente eleito com a atriz Meryl Streep no Twitter: “Trump já criticou: os republicanos, os democratas, o Papa, as eleições dos EUA, a CIA, o FBI, a NATO, Meryl Streep. Trump ainda não criticou: Vladimir Putin”.

Quarta-feira foi quando Trump esteve mais perto de criticar o líder russo, ao ser questionado sobre o relatório não-confidencial que as secretas lhe apresentaram e a Obama com “fortes indícios” de que a Rússia orquestrou uma campanha de ciberataques contra os democratas para influenciar o resultado das eleições (não confundir com o dossiê Trump). “Eles [russos] não deviam ter feito isso”, respondeu Trump. Mas acrescentou: “Se Putin gosta de Donald Trump, considero-o um ativo, não um passivo.”

Antes do encontro com os jornalistas, o Presidente eleito voltou a desmentir quaisquer ligações à Rússia - “Não tenho nada que ver com a Rússia, nenhum negócio, nenhum empréstimo, nada!” - quando uma investigação básica aos seus registos empresariais dos últimos 30 anos mostra que isso não é verdade. A este propósito, Max Boot levantou a seguinte questão no NYT: “Se Trump é genuinamente inocente quanto a qualquer ligação com o Kremlin, não quereria uma investigação completa para limpar o seu nome? O facto de se opor tão inflexivelmente a qualquer tipo de inquérito diz muito”.

Para Boot, “só há uma forma de chegar ao fundo deste caso escabroso”: criar uma comissão bipartidária no Senado para investigar todas as alegações e chegar a conclusões que sejam tornadas públicas. Está na linha não só o nome de Trump mas também de funcionários influentes envolvidos neste caso, como o diretor do FBI, James Comey - se as suspeitas forem comprovadas, estarão em causa possíveis crimes de conspiração ao mais alto nível e traição à pátria.

O eixo da (pós) verdade: Obama, a democracia, Trump e os jornalistas

 

O discurso de despedida de Barack Obama, a apenas nove dias da tomada de posse de Donald Trump, foi amargo e ensombrado por novos dados sobre alegadas ligações do Presidente eleito à Rússia. Obama já conhecia o conteúdo do dossiê e, no adeus, tentou apontar o caminho para acabar com as divisões na América e salvar a democracia. Mas o circo mediático que se gerou - e que não deverá terminar tão cedo - foi mais sonoro: pôs Trump alinhado com a Rússia contra os rivais do costume, mas também jornalistas contra jornalistas e americanos contra americanos. A era da pós-verdade em todo o seu sombrio esplendor.

 

O pilar mais forte da proclamada era da pós-verdade é a força da crença que se impõe ao conhecimento científico, ao racionalismo e aos outros valores que a humanidade colheu no Iluminismo. Donald Trump, o homem que está prestes a tomar posse como 45.º Presidente dos Estados Unidos, ‘acredita’ que as alterações climáticas, por exemplo, são um “embuste” criado pela e/ou para a China roubar postos de trabalho aos norte-americanos. Não lhe interessa que os factos e a ciência e décadas e décadas de investigação tenham já apurado, sem margem para dúvidas, que somos nós os responsáveis pela subida gradual da temperatura do planeta, encaminhados em passo acelerado para a nossa própria extinção.

Trump ‘acredita’ que as alterações climáticas não são reais e com ele milhões de americanos, incluindo grandes figuras do Partido Republicano. Trump também ‘acredita’ que as vacinas podem trazer mais mal do que bem, quando é um facto científico que esse avanço médico erradicou do planeta doenças fatais que antigamente matavam centenas de milhares de pessoas. Por não ‘acreditar’, decidiu atribuir terça-feira a um anti-vaxxer (como os céticos das vacinas são conhecidos) a tarefa de investigar a segurança desse tipo de medicação preventiva (chama-se Robert F. Kennedy Jr. e é sobrinho de JFK). Horas depois, os media eram inundados por novas e explosivas alegações sobre a relação de Trump com o governo russo, que quase roubaram protagonismo ao homem da noite: Barack Obama.

Há uma guerra contra os factos em curso e foi contra ela que o ainda Presidente Obama apontou a mira terça-feira, no discurso de despedida à nação, que escolheu proferir em Chicago, “onde tudo começou” há oito anos, e não na Casa Branca como é tradição. Num tom comedido, semblante sério, Obama pôs o dedo na ferida. Disse que “a subida do partidarismo sem pudores, o aumento da estratificação económica e regional e o estilhaçar dos nossos media em canais para todos os gostos” ajudam a “fazer parecer normal, até inevitável,” que hoje cada um escolha viver na sua “bolha”, apenas rodeado de pessoas que pensam de forma igual e totalmente desligado das restantes, “nos bairros, nos campus universitários, nos locais de culto e nos feeds das redes sociais”.
 
“Cada vez mais sentimo-nos tão seguros nas nossas bolhas que aceitamos apenas informação, verdadeira ou não, que encaixe nas nossas opiniões, em vez de basear as nossas opiniões nas provas que existem”, declarou a meio do discurso sem nunca referir o nome de Trump (salvo quando a audiência começou a gritar por “mais quatro anos” de administração Obama). “Esta tendência representa uma ameaça à nossa democracia. A política é uma batalha de ideias; no decurso de um debate saudável, vamos priorizar diferentes objetivos e diferentes formas de os atingir. Mas sem uma base comum de factos, sem a disponibilidade para admitir nova informação e para conceder que o nosso opositor apresenta argumentos válidos, e que a ciência e a razão têm importância, vamos continuar a falar para o boneco, a impossibilitar os compromissos e a existência de terreno comum.”

Seria um exercício de criatividade máxima tentar adivinhar o que Trump teria respondido a Obama, no Twitter claro, se tivesse prestado atenção ao que estava a ser dito e ouvisse nas entrelinhas críticas à sua postura e visões. Só que não prestou e a culpa foi, em parte, da CNN. Antes de Obama tomar o púlpito em Chicago para a despedida, o canal americano avançou uma notícia que desde então tem estado a dominar media, analistas e curiosos.

Fontes ligadas aos serviços de informação dos EUA disseram ao canal que, na semana passada, os diretores da CIA, do FBI e da NSA informaram Obama e Trump da existência de um dossiê que contém alegações sobre uma estratégia do governo russo em três frentes: estar a preparar o magnata de imobiliário há vários anos para o ajudar a chegar ao poder; agregar informação “comprometedora” sobre Trump para o manipular e chantagear enquanto futuro Presidente dos EUA; e, durante a campanha, manter contactos diretos e recorrentes com a equipa de Trump.

As “várias” fontes com conhecimento de causa garantem à CNN que, a mando de Vladimir Putin, o FSB (ex-KGB) está há vários anos a reunir informação “comprometedora” sobre Trump para poder controlá-lo assim que ele tomar posse a 20 de janeiro. O canal explicou que, apesar de a fonte das informações já ter sido declarada fidedigna pelas secretas, o conteúdo do dossiê apresentado a Obama e a Trump ainda não foi substanciado e que, por esse motivo, decidiu não o tornar público para já. O site BuzzFeed, sob os aplausos de uns e críticas de outros, avançou por sua conta e risco e divulgou-o. Entre as informações citadas, conta-se a alegada participação de Trump num “ato sexual perverso” num hotel de Moscovo.

À exceção do alegado episódio de ‘golden shower’ na suite presidencial do Ritz Carlton de Moscovo, em que Trump terá pago a prostitutas para as ver urinar em cima da cama onde Barack e Michelle Obama tinham dormido meses antes durante uma viagem à Rússia, todas as informações contidas no documento não são novidade - ainda há um mês a CIA disse ter provas de que a Rússia interferiu nas eleições americanas para influenciar os resultados a favor de Trump.

A história do dossiê remonta a outubro, quando a revista “Mother Jones” avançou que um ex-espião de uma nação ocidental tinha acabado de fornecer ao FBI “memorandos, com base em interações recentes com fontes russas, onde é afirmado que o governo russo está há anos a tentar cooperar com e a ajudar Trump”. O FBI “pediu mais informação” ao ex-agente, que respondeu que “houve uma troca recorrente de informação entre a campanha de Trump e o Kremlin para mútuo benefício”. Já então, um mês antes das eleições, a revista referia que “o FBI não confirmou nem desmontou nenhuma das alegações contidas nos memorandos do ex-espião”. Isso não se alterou.

A novidade é que agora se sabe que a fonte é um ex-agente do MI6 que depois de se reformar da agência secreta britânica continuou a dedicar-se ao mesmo trabalho de espionagem a troco de dinheiro. Neste caso foi inicialmente contratado por republicanos que se opunham à candidatura de Trump nas primárias do partido. Já depois disso, recebeu dinheiro dos democratas para continuar a investigar ‘podres’ sobre o rival de Clinton.

O dossiê esteve a circular pelas redações americanas e os corredores do Congresso e da Casa Branca durante meses. Vários media tentaram apurar a veracidade do que é denunciado. Nenhum conseguiu e, por essa razão, nada foi publicado. Até terça-feira. Ao publicar a notícia de que as secretas informaram Trump e Obama da existência deste dossiê, apontava esta manhã o “Huffington Post”, “a CNN está a mandar um sinal a todos os meios de que este assunto é para ser levado a sério” - se os quatro homens mais poderosos dos serviços de informação dos EUA decidiram revelar o conteúdo ao Presidente e ao seu sucessor, é porque têm confiança suficiente na informação, mesmo que apenas parcialmente.

Ao decidir publicar os documentos que as redações tinham nas secretárias há meses mas que nunca publicaram por questões éticas, o BuzzFeed conseguiu certamente atrair atenção para o assunto. Mas, inadvertidamente, também se arriscou a reforçar a ideia disseminada entre os apoiantes de Trump de que os media são mentirosos e estão investidos numa campanha de difamação e de disseminação de notícias falsas para minar a futura administração - como as notícias falsas que terão feito suficientes eleitores americanos a pender para Trump em detrimento de Clinton.

Numa nota interna enviada à redação, e posteriormente partilhada no Twitter, o diretor do Buzzfeed defendeu a decisão “nada fácil” de tornar públicas as 35 páginas de alegações não comprovadas. “O nosso objetivo é sermos transparentes no nosso jornalismo e partilhar aquilo que temos com os nossos leitores”, escreveu Ben Smith. “Neste caso, o documento estava a circular entre os mais altos níveis do governo e dos media americanos. Como sublinhamos na nossa história, existem sérias razões para duvidar das alegações. Estamos em busca de provas específicas há várias semanas e vamos continuar à procura. Publicar este documento não foi uma decisão fácil ou simples e pessoas de boa vontade podem discordar da nossa escolha. Mas publicá-lo reflete a nossa visão do trabalho dos jornalistas em 2017.”

Há um timing a ter em conta neste enredo. Não só Trump tem estado empenhado em criticar abertamente as agências secretas do país que vai liderar, optando por questionar as suas capacidades mesmo depois de a CIA lhe ter apresentado um relatório com alegadas provas de que a Rússia acedeu ilegalmente aos sistemas informáticos do Partido Democrata para influenciar as eleições, como esta quarta-feira é o dia da sua antecipada conferência de imprensa - a primeira desde que venceu as primárias republicanas em julho, inicialmente convocada para dezembro mas cancelada à última da hora nessa altura (e que decorria à hora de fecho desta edição).

Neste momento, há uma série de potenciais conflitos de interesses a que Trump ainda não deu resposta, como o que pretende fazer quanto aos seus negócios ou se vai mesmo arriscar-se a violar as leis antinepotismo ao nomear o genro, Jared Kushner, alto conselheiro da Casa Branca. E a distância que tem marcado em relação às secretas é coisa pouca quando comparada com o fosso que continua a alimentar entre a sua futura administração e a maioria dos jornalistas e jornais americanos. Ao longo desta quarta-feira, esteve no Twitter a disparar ataques contra os “media desonestos” e as agências de informação que lhes terão fornecido os novos documentos sobre a Rússia. Num dos posts escreveu: “As agências secretas nunca deveriam ter permitido que esta notícia falsa fosse ‘vazada’ para o público. O último disparo contra mim. Estaremos a viver na Alemanha nazi?”.

Mas vive-se em democracia e foi nisso que Obama se focou terça-feira em Chicago. No discurso de 51 minutos, o Presidente mencionou a palavra ‘democracia’ 20 vezes, mais do que o total combinado dos últimos 15 presidentes dos EUA em discursos de despedida.

“A menos de duas semanas da tomada de posse do sucessor Donald Trump, Obama usou o seu último discurso para defender com empenho os valores americanos”, apontava esta quarta-feira o Quartz. “Isso pode não ter satisfeito muita gente que aguardava um discurso sem papas na língua à Barack mas também não parece ter sido acidental. A repetição é básica - é a forma de ensinar as crianças a ler e os cães a sentar. Quando Obama fala de democracia 20 vezes em 50 minutos, ele não quer mesmo que nos esqueçamos do seu significado.”

Trump, Rússia, chantagem e ‘golden shower': o documento que anda a circular nos corredores de Washington

Há uma semana, as agências secretas dos EUA apresentaram a Barack Obama e a Donald Trump uma sinopse de um dossiê onde é alegado que Vladimir Putin tem estado a reunir “podres” sobre o Presidente eleito para o chantagear, ao mesmo tempo que se manteve em contacto com a equipa do americano durante a campanha para o ajudar a ganhar as eleições. Os serviços de informação ainda não apuraram a veracidade de algumas das alegações, mas garantem que a fonte é fidedigna.

Quase ninguém sabe ainda o que esperar da conferência de imprensa que Donald Trump convocou para esta quarta-feira, a primeira que dá desde que venceu as primárias do Partido Republicano em julho. O encontro com os jornalistas estava inicialmente marcado para dezembro, um mês depois de ter derrotado Hillary Clinton nas presidenciais, mas poucos dias antes foi cancelado pela equipa de Trump sob o argumento de que o Presidente eleito estava assoberbado com as tarefas que a transição política para a Casa Branca envolve.

Desde então, os media aguardam com algum entusiasmo a possibilidade de se encontrarem cara a cara com o Presidente eleito antes da sua tomada de posse, entre outras razões pelo facto de ainda não ter explicado como vai enterrar os conflitos de interesse que estão a ensombrar a dita transição – à cabeça, o facto de ter nomeado para conselheiro da Casa Branca o seu genro Jared Kushner, desafiando as leis antinepotismo em vigor nos Estados Unidos para evitar favorecimentos ilícitos.

Não deixa de ser irónico que tenha sido esta terça-feira à noite, a poucas horas da antecipada conferência de imprensa, que a CNN decidiu noticiar em exclusivo a existência de um dossiê da comunidade de serviços de informação dos EUA com alegações sobre o Presidente eleito não só estar em contacto com os mais altos cargos do Governo russo há vários meses, como estar a ser chantageado pelo Presidente Vladimir Putin, que ao longo dos últimos cinco anos terá ordenado ao FSB, antigo KGB, que reunisse dados, informações e “podres” sobre Trump para manipular uma sua eventual candidatura presidencial, durante as várias viagens do magnata de imobiliário à Rússia.

Fontes que tiveram acesso a esses documentos dizem ao canal que o conteúdo do dossiê em questão – sobretudo baseado em informações de fontes russas mas também em dados recolhidos por um ex-agente do MI6, uma das secretas do Reino Unido – foi sumarizado num documento de duas páginas que as agências norte-americanas apresentaram há uma semana a Barack Obama e ao Presidente eleito Trump.

O briefing confidencial – que o BuzzFeed decidiu divulgar pouco depois "para que o povo americano possa formar as suas opiniões" – foi apresentado a Obama e Trump por James Clapper, diretor-geral das secretas, James Comey, diretor do FBI, John Brennan, diretor da CIA, e Mike Rogers, diretor da Agência de Segurança Nacional (NSA). Uma das razões que levou os chefes dos serviços de informação a incluir no briefing uma sinopse dos documentos em questão, um passo "incomum", teve como objetivo, dizem as mesmas fontes à CNN, informar o Presidente eleito sobre as alegações que têm estado a circular entre as agências, membros do Congresso e figuras da atual administração nos últimos meses.

Não é para menos, considerando que entre elas se conta a denúncia de uma "fantasia sexual perversa" que envolveu Trump contratar várias prostitutas numa viagem a Moscovo, em 2013, e ordenar-lhes que fizessem um golden shower (urinar) na cama onde o Presidente e a primeira-dama dos EUA dormiram meses antes durante uma viagem oficial à Rússia, na suite presidencial do Ritz Carlton.

Tanto o BuzzFeed como a CNN sublinham que a veracidade desta e de outras informações contidas no dossiê ainda não foi confirmada "e pode nunca vir a ser", embora os serviços de informação norte-americanos já tenham atestado a credibilidade da fonte que as apresentou, o tal ex-espião britânico que criou uma agência de venda de informações secretas quando se reformou do MI6.

A CNN reviu as 35 páginas de memorandos, a partir das quais a sinopse de duas páginas foi produzida, e refere que essas informações foram compiladas primeiro a mando de republicanos que se opunham à candidatura de Trump e, mais tarde, a mando dos democratas que queriam minar as possibilidades de o candidato da oposição ser eleito.

Contudo, o canal referiu também que, "para já, não vai publicar detalhes sobre os memos, porque ainda não corroborou de forma independente alegações específicas" contidas no dossier. O BuzzFeed, pelo contrário, decidiu tornar pública a sinopse do material mesmo sem confirmar a veracidade do seu conteúdo, sob críticas de violação da ética profissional. Alguns jornalistas e ativistas já saíram em defesa do site, caso de Richard Tofel, presidente da ProPublica.

Mais do que o golden shower ou outras informações escabrosas que o FSB possa ter recolhido para manipular e controlar Trump, as fontes ouvidas pela CNN sublinham que os documentos servem sobretudo para reforçar a crença de que a Rússia se ingeriu de facto nas eleições americanas com o intuito de prejudicar a candidatura de Clinton. Isto porque, naquelas 35 páginas, estão incluídas alegações de que houve uma contínua troca de informações durante a campanha entre representantes do candidato republicano e intermediários do governo russo – uma teia de conspiração que já tinha sido mencionada em briefings confidenciais apresentados aos líderes do Congresso em outubro.

Quando isso aconteceu, Harry Reid, então líder da minoria democrata no Senado, enviou uma carta ao diretor do FBI, a um mês das eleições, onde o instava a revelar publicamente tudo o que a agência sabia sobre a alegada interferência russa nas eleições por intermédio do candidato Trump. "Tornou-se claro que tem em sua posse informações explosivas sobre ligações próximas e coordenação entre Donald Trump, os seus altos conselheiros e o Governo russo – um interesse estrangeiro abertamente hostil contra os EUA."

James Comey não só ignorou esse pedido como, a apenas nove dias da ida às urnas, decidiu anunciar publicamente a reabertura da investigação a Clinton por causa do pretenso escândalo de emails no servidor privado que usou enquanto chefe da diplomacia no primeiro mandato de Obama. Foi uma decisão aparentemente política que terá custado a vitória da candidata democrata, como a própria denunciou no rescaldo da sua derrota, com um caso que rapidamente se comprovou ser um não-assunto.

Diante de um painel de senadores da comissão de serviços de informação da câmara alta do Congresso, Comey declarou esta terça-feira que "nunca comentaria investigações, se estão em curso ou não, num fórum aberto como este", quando foi questionado sobre se o FBI já abriu ou não um inquérito às alegadas ligações de Trump à Rússia. "Espantoso, considerando que [em outubro] passou a linha ao falar de Hillary Clinton" num fórum ainda mais público, nas televisões para toda a nação ouvir, sobre uma investigação em curso que foi rapidamente abandonada por falta de coerência – assim reagiu o site "New Civil Rights Movement".
 
Ao "The Guardian", fonte da administração Obama disse, sob anonimato, que a fonte das novas alegações é "consistentemente fidedigna, meticulosa e bem-informada e tem a reputação de ter uma extensa rede de contactos russos". Num dos documentos, que o jornal britânico também consultou e que terão sido entregues ao FBI pelo senador republicano John McCain, é revelado que o Kremlin esteve a "cultivar, a apoiar e a dar assistência a Trump" pelo menos nos últimos cinco anos, com o objetivo de encorajar "divisões na aliança ocidental". Putin também ordenou a recolha de informações sobre Clinton, mas desse dossiê constarão apenas pouco mais do que conversas da ex-secretária de Estado escutadas por agentes do FSB em viagens de Clinton à Rússia; a coisa mais escandalosa que conseguiram recolher foi ouvir a candidata a desdizer em privado coisas que defende publicamente.

No mesmo memorando é ainda referido que apesar de Trump ter recusado "várias propostas de negócios de imobiliário oferecidas de bandeja pela Rússia", em particular relacionados com o Mundial de futebol de 2018, o Presidente eleito "e o seu círculo próximo aceitaram o fluxo regular de informações secretas do Kremlin, incluindo sobre os seus rivais políticos, entre eles a candidata democrata". E acrescenta: "O FSB tornou Trump vulnerável através das suas atividades em Moscovo o suficiente para conseguir chantageá-lo."

A equipa de transição de Trump continua em silêncio desde as revelações, escusando-se a responder a vários pedidos de comentário da CNN, do "The Guardian" e de outros meios. Já no Twitter, a plataforma de eleição de Trump para comunicar com os eleitores, o futuro líder norte-americano clamou: "NOTÍCIAS FALSAS - UMA CAÇA ÀS BRUXAS TOTALMENTE POLÍTICA!" Resta saber que declarações fará, ou não, esta tarde, quando se encontrar com os jornalistas americanos em Nova Iorque.

Trump garante que nunca foi chantageado pela Rússia

“Vivemos na Alemanha nazi?” O Presidente eleito já respondeu, mais uma vez via Twitter, às acusações de que os serviços secretos russos têm material alegadamente comprometedor contra ele. Kremlin também desmente.

O Presidente eleito dos Estados Unidos assegura que a Rússia nunca tentou chantageá-lo com informação comprometedora, numa reação às notícias de que Moscovo possui informações embaraçosas sobre a sua vida pessoal e profissional. "A Rússia nunca tentou influenciar-me. NÃO TENHO NADA A VER COM A RÚSSIA: NEM NEGÓCIOS, NEM EMPRÉSTIMOS, NADA!", escreveu Trump, esta quarta-feira, na rede social Twitter, sobre as alegações veiculadas pela CNN e outros media. "As agências de informações nunca deviam ter permitido que estas notícias falsas fossem filtradas para o público. Mais um tiro contra mim. Vivemos na Alemanha nazi?", acrescentou naquela rede social, horas antes de dar a primeira conferência de imprensa desde que foi eleito.

A CNN, o "Washington Post" e o "New York Times", entre outros, publicaram esta terça-feira notícias citando um relatório dos serviços de informações dos EUA segundo o qual a Rússia tem informação comprometedora suficiente para "chantagear" Donald Trump. Segundo aqueles meios, o relatório foi entregue na semana passada ao Presidente cessante Barack Obama e ao Presidente eleito Donald Trump. A Rússia já negou esta manhã essas alegações, qualificadas pelo porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, de "absolutamente falsas". "É uma falsidade absoluta, fabricada" por quem tem interesse em "prejudicar as relações bilaterais" russo-norte-americanas.

Segundo os media norte-americanos, a informação na posse da Rússia inclui um vídeo sobre uma suposta "perversão sexual" de Trump, filmado com prostitutas num hotel da capital russa, e sobre lucrativos negócios imobiliários oferecidos por Moscovo ao Presidente eleito. Trump já tinha reagido num primeiro momento, pouco após a divulgação das notícias, escrevendo no Twitter que está a ser alvo de uma "caça às bruxas política".

Trump responsabiliza Moscovo no caso de espionagem 

 

Na primeira conferência de imprensa de Donald Trump em cinco meses, o Presidente eleito dos EUA apontou o dedo à Rússia no caso da espionagem informática e garante que manter uma boa relação com a Rússia será uma vantagem. “Se Obama não gosta da Rússia não acho isso um trunfo, mas uma fraqueza. Se Putin gosta de Trump não acho isso uma desvantagem, mas uma vantagem”.

Foi num tom entusiástico que Donald Trump começou esta quarta-feira a sua primeira conferência de imprensa em quase seis meses. Na intervenção inicial, o Presidente eleito dos EUA reafirmou que irá liderar uma das maiores administrações do país e sublinhou que já está a trabalhar com a sua equipa no projeto económico. “Eu serei o maior produtor de postos de trabalho que Deus criou. Estou a falar a sério. Temos aqui um movimento que o mundo nunca viu antes, um movimento que muita gente não esperava”, disse Trump aos jornalistas. Como exemplo, lembrou que várias marcas de automóveis vão voltar a produzir nos Estados Unidos, como a Fiat, Chrysler e a Ford. Disse também esperar que a indústria farmacêutica siga o mesmo caminho, anunciando novos procedimentos para os concursos públicos.

Respondendo às primeiras questões dos jornalistas, Trump apontou o dedo à Rússia no caso da espionagem informática, que teve como alvo Hillary Clinton, e defendeu que manter uma boa relação com a Rússia será uma vantagem para o país. “O hacking pode ter tido origem russa, mas também houve hacking por parte de outros países. Provavelmente a China é também responsável, houve imenso hacking. O Comité Nacional Democrata estava completamente aberto ”. “Se Obama não gosta da Rússia não acho isso um trunfo, mas uma fraqueza. Se Putin gosta de Trump não acho isso uma desvantagem, mas uma vantagem”, acrescentou. Trump assegurou que não tem qualquer negócio pendente, empréstimo ou dívida com a Rússia e que “todos os países irão respeitar mais os EUA do que nas administrações anteriores.”

Para falar dos negócios, Trump passou a palavra à advogada Sheri Dillon, que garantiu que não haverá qualquer conflito de interesses, uma vez que o Presidente eleito dos EUA cedeu a gestão das suas empresas aos filhos Don Jr. e Eric. “Ele incumbiu-me a mim e aos meus colegas de arquitetar uma estrutura que o isolará completamente da gestão do seu grupo empresarial. A questão do conflito de interesses não se coloca de todo ao Presidente e ao vice-presidente”, rematou.

De ‘regresso’ para responder a nova ronda de questões, Trump foi demolidor quanto ao Obamacare. “Foi um desastre completo e total”, disse, para garantir que “o mais fácil seria ficar sentado a observar e deixar o sistema implodir em 2017”. “Mas não seria justo para as pessoas”, acrescentou. Assim, o novo Presidente afirma que o Obamacare vai ser “anulado e substituído”, por um novo sistema, “melhor e mais barato”.

Num momento de maior tensão, Donald Trump acusou alguns meios de comunicação social de serem feitos por “pessoas muito desonestas” e recusou responder ao jornalista da CNN, um dos órgãos que na terça-feira publicou notícias citando um relatório dos serviços de informações dos EUA, segundo o qual a Rússia tem informação comprometedora suficiente para “chantagear” Trump. Depois de afirmar que os ataques de hackers contra os Estados Unidos partem de todos os lados - “Rússia, China...” - o novo Presidente norte-americano afirmou que vai dar 90 dias aos serviços secretos para produzirem um novo relatório sobre as suspeitas de espionagem informática. A Rússia poderá estar por trás dessas ações, voltou a admitir, não sem acrescentar que “também pode ter sido outro país”.

Promessa recorrente durante a campanha, Donald Trump voltou a garantir que o muro de separação entre os EUA e o México vai mesmo ser construído. “E o México vai pagar. Seja através de um imposto ou como pagamento, não sei. Mas vai acontecer”.

Rússia nega ter informações comprometedoras sobre Trump. “É um bluff total”

 

O Presidente eleito dos EUA ainda não reagiu oficialmente às alegações contidas no dossiê que os serviços de informação lhe apresentaram há uma semana, bem como a Barack Obama, onde é alegado que esteve envolvido em “atos sexuais perversos” -uma das informações que Moscovo estará a usar para o controlar - e que a sua equipa esteve em contacto com intermediários do governo russo ao longo da campanha presidencial.

O governo de Vladimir Putin reagiu esta quarta-feira às alegações de que tem em sua posse informações embaraçosas sobre Donald Trump, garantindo que esse não é o caso e acusa os media norte-americanos de "fabricarem" as denúncias com o objetivo de danificar as relações de Moscovo com Washington a apenas nove dias da tomada de posse de Trump. O Kremlin garante que não tem qualquer "informação comprometedora" sobre Trump nem sobre a sua rival democrata nas eleições de 2016, Hillary Clinton, dizendo que os alegados memorandos entregues às chefias dos serviços de informação norte-americanos por John McCain e apresentados, por estas, a Obama e Trump na semana passada são um "bluff total".

Numa conferência de imprensa em Moscovo, esta manhã, o porta-voz de Vladimir Putin, Dmitry Peskov, sublinhou: "Este relatório não corresponde à realidade e não passa de absoluta ficção. É um bluff total, uma absoluta fabricação, um disparate completo." Peskov é citado nos documentos em questão, onde é alegado que, sob ordens diretas de Vladimir Putin, tem em sua posse e sem partilhar com mais ninguém uma pasta com informações sobre Hillary Clinton obtidas por espiões russos durante viagens oficiais da rival de Trump à Rússia.

Questionado sobre se as alegações relacionadas com Clinton são verdadeiras, Peskov voltou a desmentir. "Claro que não. O Kremlin não recolhe informações comprometedoras. O Kremlin e o Presidente russo estão investidos em construir relações com os nossos parceiros estrangeiros, em primeiro lugar para proteger os interesses da Federação Russa e do povo russo, e em segundo os interesses da paz, estabilidade e segurança globais."

De uma forma geral, em causa está um conjunto de documentos sobre contactos diretos e recorrentes entre a equipa de Trump e intermediários do governo russo ainda durante a campanha eleitoral, que vem reforçar a crença das agências de informação americanas de que Putin tentou influenciar o resultado das eleições – uma acusação já feita pela atual administração e vários legisladores americanos, com base em provas recolhidas sobre as ligações de autoridades russas aos ciberataques executados contra o Partido Democrata.

O dossiê onde é alegado que Trump e Moscovo estão em contacto há pelo menos cinco anos não faz parte do outro relatório que as secretas apresentaram a Barack Obama e a Donald Trump, há alguns dias, sobre a ingerência russa nas eleições através de ciberataques ao Partido Democrata e ao email de John Podesta. Tem por base informações de fontes russas e também de um ex-agente britânico do MI6, cujo currículo e atividades foram considerados legítimos pelos serviços de informação dos EUA. No dossiê é ainda denunciada a alegada estratégia russa de recolher informações embaraçosas e potencialmente fatais, num sentido político, sobre Trump, para poder chantageá-lo e manipulá-lo.

Os papéis foram entregues ao Presidente eleito e ao Presidente em funções pelos quatro chefes máximos das secretas há uma semana, acompanhados de uma sinopse de duas páginas que o BuzzFeed decidiu entretanto publicar. Segundo a CNN, que foi a primeira a avançar a notícia em exclusivo, todos estes dados, datados de junho a outubro de 2016, foram compilados pelo ex-agente do MI6 a troco de dinheiro, primeiro contratado por republicanos que se opunham à candidatura de Trump, e, mais tarde, pelos democratas. No sumário do dossiê é denunciado que Trump esteve envolvido em "atos sexuais perversos" numa viagem a Moscovo, em que contratou prostitutas e lhes ordenou que fizessem um golden shower (urinar) na mesma cama da suite presidencial do Ritz Carlton onde Barack e Michelle Obama tinham ficado meses antes.

Até agora, nem a equipa de transição de Trump nem o próprio Presidente eleito reagiram oficialmente às alegações. Ao site Mic, o advogado do empresário tornado político, Michael Cohen, desmentiu categoricamente a veracidade das informações. "É ridículo em tantos níveis. A pessoa que criou isto claramente fê-lo com a sua imaginação na esperança de que os media liberais noticiassem esta informação falsa sob qualquer argumento que possam ter."

Contactada repetidamente pelo BuzzFeed, CNN, "The Guardian" e outros jornais, a equipa do Presidente eleito recusou-se a comentar as notícias. Trump, por sua vez, recorreu ao Twitter como é costume para denunciar a "caça às bruxas política" de que está a ser vítima. Para esta quarta-feira o futuro líder dos EUA tem marcada uma conferência de imprensa que deveria ter acontecido em dezembro, mas que Trump adiou para este 11 de janeiro – será a sua primeira conferência com jornalistas desde que conseguiu a nomeação republicana em julho para disputar as presidenciais.

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