MEMÓRIAS HISTÓRICAS CONDICIONAM FIM
DA CRISE POLÍTICA EM MOÇAMBIQUE
Severino Ngoenha, Lusa – 12.06.2016
O filósofo
moçambicano Severino Ngoenha defende que as forças dominantes continuam
agarradas a memórias históricas e a pseudo-estatutos que impossibilitam as
conversações para ultrapassar a crise política e militar em Moçambique,
classificando as negociações restabelecidas de “diálogo de surdos”.
“Estamos
perante um diálogo de surdos”, lamentou, em entrevista à Lusa, o reitor da
Universidade Técnica de Moçambique, observando que a Frente de Libertação de
Moçambique (Frelimo), partido no poder, e a Resistência Nacional Moçambicana
(Renamo), maior força de oposição, estabeleceram pré-condições que
impossibilitam as negociações.
Num momento
em que as conversações foram restabelecidas, depois de terem sido paralisadas
com a retirada da Renamo, que alegou falta de progressos e de seriedade,
Severino Ngoenha entende que o processo negocial entre as partes está refém da
“memória histórica” da Frelimo, que reclama a posição de movimento libertário,
e do “pseudo-estatuto” da Renamo, que se afirma como o “trazedor da democracia
em Moçambique”.
“Para a
Frelimo, negociar significa que a Renamo se submeta, e, para a Renamo, negociar
significa que a Frelimo faça concessões”, declarou o académico, observando que,
nestas circunstâncias, negociar torna-se uma tarefa impossível.
Para o autor
da “Terceira Questão”, sob ponto de vista racional, as autarquias provinciais,
proposta da Renamo chumbada pela Assembleia da República em 2015, não possuem
impedimento e são necessárias condições para a implementação de um sistema
descentralizado em Moçambique.
Na opinião de
Severino Ngoenha, o argumento constitucional defendido pelo Governo para
rejeitar o projecto é infundado, na medida em que a Constituição não é um
instrumento fechado, pelo contrário, a mesma deve depender das “metamorfoses
que o país sofre” em cada contexto.
Severino
Ngoenha entende que a implementação das autarquias provinciais iria exigir que
Moçambique criasse estruturas que garantam um diálogo permanente entre o
Governo central e as autoridades provinciais, impedindo que o poder local não
faça da província uma propriedade privada e evitando que o país caia num
tribalismo.
“Seria
preciso garantirmos que a solidariedade nacional continuasse no centro do
debate, apesar de termos um país descentralizado”, sustentou, observando que a
falta de um diálogo saudável poderia agravar ainda mais a crise política e
militar no país.
Ao analisar
a democracia moçambicana no momento, Ngoenha constata que as últimas eleições
de 2014 abriram espaço para a transformação dos partidos políticos em aparatos,
reiterando que Moçambique vive uma “pós-política”, um “debate político sem
ideias políticas”.
“Não há
ideias políticas, não há projectos políticos e, no nosso caso, as eleições são
uns simples exercícios de substituição de pessoas no poder”, afirmou,
sustentando que forças políticas dominantes, nomeadamente a Frelimo, a Renamo e
Movimento Democrático de Moçambique, não apresentam nenhum projecto
alternativo.
O reitor da
Universidade Técnica de Moçambique alertou ainda para uma falha no contrato
social moçambicano, considerando que os níveis de disparidade económica no país
tendem a subir.
“Existe
apenas duas etnias em Moçambique: os que têm dinheiro e os que não têm”, declarou,
acrescentando que, em muitos casos, a desproporção em termos daquilo que as
pessoas têm é a base de muitos problemas sociais.
Moçambique
tem conhecido um agravamento da violência política, com relatos de confrontos
entre a Renamo e as Forças de Defesa e Segurança, além de acusações mútuas de
raptos e assassínios de militantes dos dois lados e ainda ataques atribuídos
pelas autoridades ao braço militar da oposição a alvos civis no centro do país.
Apesar da
disponibilidade para as conversações, as últimas semanas foram marcadas por
várias acções militares atribuídas pelas autoridades moçambicanas a homens
armados da Renamo, incluindo ataques a viaturas civis e assassínio de
dirigentes da administração local.
O principal
partido da oposição recusa-se a aceitar os resultados das eleições gerais de
2014, ameaçando governar em seis províncias onde reivindica vitória no
escrutínio.
PS: Ingrata
política em Moçambique! Há guerra e há quem diz não haver guerra, porque está
em Maputo, bem protegido e vivendo às farturas. Há quem reclama o direito de
governar as seis Províncias do Centro e Norte de Moçambique (Sofala, Manica,
Tete, Zambézia, Nampula e Niassa) onde ganhou as eleições, mas é precisamente
lá onde mata indiscriminadamente as pessoas que lhe elegeu; os que lhe
elegeram, andam refugiados no Malawi; é lá onde as escolas estão a fechar,
privando as crianças de estudarem para desenvolverem aquelas regiões; é lá onde
as empresas estão a fechar por causa da guerra, agravando-se o desequilíbrio de
desenvolvimento regional, beneficiando a Região Sul que está a florescer. A
pergunta que fica é: A quem se quer governar em Sofala, Manica, Tete, Zambézia,
Nampula e Niassa, se se está a matar as pessoas! A causa que se defende é mesmo
genuína ou porque o País não está preparado para ter um dirigente que não seja
do Sul.
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