O POVO EXIGIA INDEPENDÊNCIA
(O denominado Massacre de Mueda)
Em vagas sucessivas, chegaram a vila de Mueda seis grupos de nacionalistas moçambicanos para exigir a liberdade às autoridades coloniais.
O primeiro
grupo que chegou a Mueda foi recebido pelo administrador Joaquim Alves. Depois
de um encontro breve, o administrador mandou Vanomba regressar a Tanganyika com
a ameaça de que não voltasse mais a Moçambique com “ideias erradas”.
O segundo
grupo chegou a Mueda pouco tempo depois de Faustino Vanomba ter regressado a
Tanganyika. Este grupo era liderado por Ernesto Abdala, que teria vindo de
barco e foi recebido pelo administrador colonial Joaquim Alves em Mocímboa da
Praia. Depois destas duas vagas de nacionalistas vindos do Tanganyika para
exigirem a independência, o administrador Joaquim Alves foi transferido de
Mueda e em seu lugar foi indicado Garcia Soares.
O novo
administrador de Mueda, ainda caloiro, recebeu o terceiro grupo liderado por
Tiago Mula, homem admirado e respeitado pela população devido à sua
frontalidade e coragem. Tiago Mula teve vários encontros com o administrador
Garcia Soares cerca de duas semanas. O nacionalista Tiago Mula foi preso e
levado para Lourenço Marques.
Renovando as
pegadas de Tiago Mula, apresentou-se à administração de Mueda o quarto grupo
cuja responsabilidade esteve a cargo do compatriota Makaba que foi igualmente
preso.
O quinto
grupo, chefiado por Simon Nchusha chegou a Mueda após a prisão de Makaba.
O grupo dos
7 teve diálogo de muita frontalidade e azedo com o administrador colonial. Os
sete membros do quinto grupo acabaram sendo presos e enviados para a cadeia em
Lourenço Marques.
Como se pode
ver, por um lado, a administração colonial decidira mudar de estratégia. O
administrador Garcia Soares endureceu o modo de actuação privilegiando prisões
dos nacionalistas.
Em 12 de
Junho de 1960 chega a Mueda o grupo composto por Shibiliti Diwani, chefe, e
Faustino Vanomba, seu adjunto que voltava a Mueda pela segunda vez. Após o
encontro com o administrador, Shibiliti Diwani e Faustino Vanomba foram se
instalar no povoado de Nandang’a, onde estabeleceram encontros com várias
pessoas influentes e fizeram passar a mensagem sobre o verdadeiro motivo que os
levava a Mueda.
A reunião
foi marcada para o dia 16 de Junho, com a obrigatoriedade de os chefes locais
convocarem a população para estar presente. A convocatória foi extensiva aos
padres católicos das missões locais.
No dia 16 de
Junho de 1960, muita gente acorreu à Administração de Mueda acreditando que
seria naquele dia em que os portugueses reconheceriam o direito à
independência. Tinha sido convocada não só a população de Mueda, mas também de
outras áreas como Muidumbe, Nangade e Mocímboa da Praia.
A grande
mobilização popular que aconteceu teve com origem no facto de, à sua entrada na
Administração de Mueda, Shibiliti Diwani ter se deparado com um numeroso grupo
de pessoas aglomeradas no pátio. Espantado, questionou as autoridades coloniais
a razão da permanência daquelas pessoas alí. As autoridades afirmaram que
desconheciam a razão e, face à essa resposta, Shibiliti foi questionar as
pessoas por que se encontrava ali. Estas reponderam que tinham sido recrutados
compulsivamente para ir trabalhar numa plantação de sisal em Mpanga, localizada
a cerca de 12 km da vila de Mocímboa da Praia.
Indignado e
face à falta de argumentos das autoridades coloniais, Shibiliti Diwani ordenou
a multidão para regressar à casa. Este acto de coragem e de liderança, foi o
maior factor de mobilização das massas para a fatídica reunião de 16 de Junho
de 1960.
No entanto,
as autoridades coloniais tinham feito o plano minucioso para cometer o crime em
Mueda a fim de mostrar o poder colonial. De Porto Amélia, hoje Pemba, partiu
para Mueda um pelotão de 35 homens do exército colonial bem armado, comandado
pelo Tenente Tito Xavier.
A população
permaneceu longas horas junto da Administração de Mueda, esperando
pacientemente a chegada da hora para ouvir o que mais ansiava. Choveu nesse
dia. Ninguém arredou o pé.
Velhos,
jovens, crianças, homens e mulheres acorreram ao recinto da Administração para
ouvirem “novidades”.
O
administrador ordenou que os chefes locais dos povoados fossem separados do
conjunto da população.
O Governador
mandou ainda arriar a bandeira para de volta estiar na presença dele e da
população. De seguida chamou aos líderes dos revoltosos: Shibiliti Diwani e
Faustino Vanomba aquém perguntou o que queriam. Estes responderam que queriam a
“Independência”. O chefe do poder colonial ficou insatisfeito e nervoso. O
governador tentou convencer os líderes dos revoltosos com promessas que davam
conta de que ele queria a paz e a partir daquele dia, os negros e brancos
poderiam casar entre si. As promessas incluíam o aumento do preço de compra dos
produtos agrícolas dos camponeses. Essas palavras não convenceram os líderes
dos manifestantes.
O governador
Almirante Teixeira da Silva veio a público para convidar mais pessoas que
quisessem colocar preocupações a ele. Seis homens mais duas mulheres
ofereceram-se e foram para o interior do gabinete do administrador. Foi depois
do encontro com estes peticionários que o Governador sai e dirigiu-se ao
público com o discurso segundo o qual, ele viera para informar que o governo
português tinha decidido aumentar o preço de milho, amendoim, castanha de cajú,
gergelim, etc. O público atencioso, revoltou-se ao mesmo tempo afirmando que
queria UHURU.
O
Governador, contrariado pela atitude dos camponeses reivindicadores regressou
ao gabinete. Poucos tempo depois, Shibiliti Diwani, Faustino Vanomba e mais os
oito compatriotas que tinham acabado de se juntarem com os primeiros dois no
gabinete do administrador saíram algemados do gabinete, a serem empurrados como
animais selvagens para a varanda da administração, e conduzidos para a viatura
de marca Land Rover para onde são levados e obrigados a entrarem na viatura.
A multidão
enfurecida tentou abrir caminho para agredir o Governador e impedir a
deslocação da viatura do local onde se encontrava. O. Governador viu-se
impedido de entrar na sua viatura cercada pelos amotinados. A multidão gritava
ainda que não tinha ido a Mueda para ver pessoas a serem presas, ao mesmo tempo
que soltava gritos segundo as quais “este carro não sai daqui e o Sr. não
entra!”.
Empunhando a
arma de tipo pistola na mão, o Sr. Governador Almirante Teixeira da Silva,
dispara o ar e ordena “fogo”.
O pelotão do exército colonial que estava de alerta e que se escondera nas imediações do recinto, assaltam a área com disparos contra a multidão. Os cipaios juntaram-se ao exército português na chacina das populações.
Assim foi
consumado o massacre de Mueda onde cerca de 600 pessoas foram barbaramente
mortas, porque ousaram pedir a liberdade e a justiça social.
O pároco da
Missão de Lipelwa, que se localizava perto de Mueda, o Sr. Padre Van-Mberque
coube-lhe a responsabilidade de dar a bênção aos corpos empilhados e o Sr.
Governador Almirante Teixeira da Silva seguiu caminho no seu carro de regresso
a Porto Amélia, tranquilo, com as mãos cheias de sangue.
Os corpos
dos compatriotas assassinados em Mueda foram enterrados em vala comum no dia 17
de Junho de 1960 por uma secção de 13 cipaios.
O Massacre
de Mueda veio elevar mais a consciência nacionalista dos camponeses de Cabo
Delago e dos moçambicanos em geral do Rovuma ao Maputo e do Zumbo ao Índico de
lutar contra o regime colonial em Moçambique. Por isso, o massacre de Mueda
transformou-se em catalisador do início da Luta de Libertação Nacional.
Referências
Matusse, R..,
(2015). Captura do Quartel de Omar. (Maputo: ARPAC).
Moiane, J.,
(2009). Memórias de um Guerrilheiro. (Maputo: King Ngungunhane Institute).
Pachinuapa,
R., Liphola, M., & Tiago, P. (Eds.). (2015). Moçambique: 40 Anos de
Independência e Soberania. (Maputo: Nachingwea Editores).
Pachinuapa,
R. (2011). Memória das Revolução 1962 -1974. (Maputo: Nachingwea Editores).
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