O TOQUE DE MIDAS DE FILIPE NYUSI
Por: Marcelo Mosse, 16 de Agosto de 2018

Ontem, ao aprovar a composição da Comissão para os Assuntos Militares, promovendo inclusive alguns elementos da ala castrista da Renamo, Filipe Nyusi empurrou a carruagem da pacificação nacional para uma recta donde não se tem retorno.

Há dez dias, ao assinar o acordo com sua contraparte da Renamo, o General Ossufo Momade, Nyusi selou um pacote de confiança e as listas dos militares da oposição foram submetidas ao Executivo, dois dias depois, para o desconforto dos mais cépticos do lado do regime.

Há dez dias, Nyusi e Momade inauguraram nova etapa do processo, deixando para trás uma inaudita maneira de pacificaçāo militar, na base da informalidade e sem o olhar tutelar estrangeiro, por detrás dum imaginado aperto de mãos entre o PR e o finado líder da Renamo, Afonso Dhlakama, um patamar de encontros entre irmãos desavindos que só tem paralelo com o aperto de mãos entre Nelson Mandela e Frederik de Klerk em 1992: um aperto sem o ruído por vezes perverso da mediação estrangeira.

Há dez dias, a informalidade do diálogo foi deixada para trás (um dia, essa informalidade, essa maneira de chegar a acordos estruturantes fortemente impregnados na nossa tradição oral vai ser uma case study na academia).

Ontem Nyusi accionou a engrenagem decisiva, empurrando Moçambique para uma nova etapa da sua jovem história política. As forças armadas já têm elementos da Renamo em seus lugares de destaque. Daqui em diante, as decisões operacionais do Exército terão também a māo da Renamo, sedimentando a confiança entre as partes, essencial para que a desmilitarização ocorra sem percalços.

Do lado da Renamo, Ossudo Momade tem garantido uma coesão que muitos desconfiavam fosse possível sem Dhlakama. Sem o poder formal de um líder, Momade se transmuta em conciliador, a ponte entre a desconfiada classe militar e suas correntes políticas integradas na vida urbana. Momade vai conquistando também o seu lugar, desfazendo aquele semblante weird que trajava quando deixou Nampula para escalar a Gorongosa profunda.

Se é certo que, no meio de tudo isto, quem ganha é a sociedade e a economia nacional, há um homem cuja persistência foi fundamental para Moçambique chegar até onde chegou.

O Presidente Filipe Nyusi deu ontem o golpe final na arrogância dos indefectíveis da savimbinização do país. Sem Dhkalama, quando parecia que os pilares com ele implantados iriam desabar, Nyusi permaneceu sereno, sondando a capacidade da Renamo em se adaptar ao enredo longe da batuta do seu líder.

Essa capacidade foi apreendida, incluindo quando os radicais do regime tentavam insistentemente empurrar o PR para o seu campo revanchista, com a Renamo se mostrando atenta a esses sinais, exibindo instrumentalmente sua retórica musculada quando necessária.

Com as decisões de ontem, este Presidente vai ser reconhecido nos anais da historia de Moçambique como aquele que soube buscar os consensos necessários para o país reencontrar o caminho da paz definitiva, depois destes longos anos de discórdia.

Ontem, foi uma data na história, com o toque de Midas de Filipe Nyusi.

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