PESQUISA EXPLORATÓRIA TENTA EXPLICAR O TERROR
DO NORTE DE CABO DELGADO
Agentes da PRM expulsos treinam
atacantes
In: MEDIA FAX, 30 de Abril de 2018
Um estudo explica que o grupo surge no norte de
Cabo Delgado, primeiro como um grupo religioso e, em finais de 2015, passa a
incorporar células militares.
De 5 de Outubro de 2017, dia do primeiro ataque atribuído a um grupo com
inspiração no fundamentalismo islâmico, o norte de Cabo Delgado não consegue
mais encontrar espaço para tranquilidade e segurança públicas. Pior é que
ninguém conseguiu ainda explicar, objectivamente, a proveniência, a fonte de
financiamento, o treinamento militar, os reais interesses que o grupo persegue,
entre outras perguntas que continuam a ser feitas em torno dos ataques que têm
estado a acontecer no norte de Cabo Delgado.
Na perspectiva de ajudar a entender alguns contornos, respondendo a algumas
perguntas colocadas, o Instituto de Estudos Sociais e Económicos de Moçambique
(IESE) e o Mecanismo para o Apoio à Sociedade Civil (MASC) decidiram avançar
com uma pesquisa exploratória que incidiu sobre a análise bibliográfica e ainda
um intenso trabalho de campo.
Uma das respostas encontradas no trabalho de campo foi a que traz a
revelação segundo a qual, internamente, o grupo ou os grupos que semeiam terror
estejam a ser treinados por antigos agentes da Polícia da República de
Moçambique (PRM), expulsos da corporação por comportamento e atitudes
incompatíveis com a função.
Assinado pelos pesquisadores Saíde Habibe, Salvador Forquilha e João
Pereira, o estudo indica que, fora das fronteiras nacionais, o grupo é treinado
por várias milícias, particularmente da região dos Grandes Lagos.
“De acordo com fontes locais, havia dois tipos de campos de treinamento:
internos: no distrito de Macomia (Mucojo); em Mocímboa da Praia
(particularmente nos quintais das casas dos líderes do grupo); em Montepuez
(Namanhumbir); externos: na Tanzânia (Kibiti) e na região dos Grandes Lagos” –
refere o estudo, acrescentando e especificando que “internamente eram treinados
por agentes da PRM expulsos da corporação e agentes de guarda fronteira; fora
do país eram treinados por milícias, particularmente, na região dos Grandes
Lagos”.
Do ponto de vista de treinamento externo, acrescenta a pesquisa “os chefes
das milícias eram contratados pela rede de Al-Shabaab
da Tanzania, Quénia e Somália para dar treinamento aos recrutas que saíam da
zona Norte de Moçambique e, em troca, os chefes das milícias recebiam valores
monetários”.
A ideia da pesquisa exploratória é que sirva de base para um estudo mais
elaborado e aprofundado, tudo na pespectiva de buscar-se respostas para
perguntas mais profundas que são colocadas em relação aos ataques e insegurança
generalizada que se instalou nos distritos do norte de Cabo Delgado, incluindo
o actual e futuro coração económico do país, o distrito de Palma, onde estão a
ser investidos biliões de dólares norte americanos no âmbito da exploração da
considerável quantidade de hidrocarbonetos disponível.
A pesquisa explica ainda que o grupo surge na zona norte de Cabo Delgado,
primeiro, como um grupo religioso e, em finais de 2015, passa a incorporar
células militares. Aliás, acrescenta, inicialmente, o grupo era conhecido por Ahlu Sunnah Wa-Jamâ, que na língua árabe
significa “adeptos da tradição profética e da tradição”.
Na opinião do grupo, as comunidades locais não estavam a praticar um Islão
que fosse da linha do Profeta Muhammad. Apesar desta ideia, os pesquisadores
entendem que o grupo não tem uma doutrina bem elaborada, mas possuem uma
propaganda baseada na necessidade da “recuperação dos valores tradicionais do
Islão”.
Para o grupo, o Islão actualmente praticado nas mesquitas locais é um Islão
degradado. Por isso eles entram nas mesquitas de calçado e munidos de armas
brancas e acabaram por criar os seus próprios espaços de culto; o não
reconhecimento das estruturas do Estado; implantação da Sharia” – refere a
pesquisa.
O grupo é, maioritariamente, constituído por jovens islâmicos oriundos de
Mocímboa da Praia e distritos circunvizinhos, tendo as populações locais passado
a chamar o grupo por Al-Shabaab, que
quer dizer (em árabe) juventude.
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