CINEMA KUDEKA
RM Kuyeri, 26 de Abril de 2021
O Cinema Kudeka foi um excelente estabelecimento de cinema ao ar livre, localizado na Cidade de Tete. As obras da construção do espaço cultural iniciaram em Maio de 1974, logo depois do 25 de Abril de 1974, e foram concluídas pouco antes da proclamação da Independência Nacional.
A obra-prima artística à beira do Rio Zambeze ficou a ser o segundo símbolo da Cidade de Tete, a seguir ao emblemático símbolo luminoso HOTEL ZAMBEZE.
O Cinema Kudeka foi inaugurado precisamente no dia 25 de Junho de 1975, acto que foi marcado por um espetáculo cultural e cinematográfico no âmbito das comemorações do Dia da Independência Nacional, o que catapultou o local como um símbolo histórico de orgulho nacional que devia ser preservado por todos os moçambicanos.
A ideia da construção do Cinema Kudeca foi da Moçambique Filmes, pertencente a um grupo de uns empresários associados que tinham casas de cinema em Moçambique e em Angola, daí que construíram o Cinema Kudeka como réplica de um estabelecimento idêntico localizado na Cidade de Luanda, a capital da República de Angola.
Em 1978, o Cinema Kudeka foi nacionalizado pelo Governo, tendo a
Sociedade do Kudeka vendido as suas acções ao Instituto Nacional de Cinema e
Audiovisuais. Contudo, na óptica dos sócios daquele cinema o processo de venda
não teria sido nem
justo, nem pacífico.
Pelo facto de, na altura, a sociedade encontrar-se ainda coesa, os seus membros indagaram os procedimentos e trocaram correspondências com o Governo provincial e central numa autêntica luta que durou cerca de 14 anos de discussões, sem água vem, nem água vai.
Finalmente, o Cinema Kudeka acabou sendo recuperado pelos sócios na década de 1990. Na altura o Cinema Kudeka era bastante concorrido, sendo um dos locais de lazer mais preferidos pelos citadinos de Tete. Porém, esse sucesso durou menos de dez anos, pois, o seu objecto social já não lograva quase nada, dado que o aparecimento de estações televisivas começou a ofuscar o cinema de 35 milímetros, fazendo-o perder a frequência.
Dizer que este fenómeno não só ocorreu na Cidade de Tete mas, sobretudo nas pequenas cidades de todo este Moçambique, incluindo a grande Cidade Capital, Maputo, onde a tradição de ir à matiné com as crianças e ao cinema com a namorada caíram em desuso. Esta foi a razão pela qual o Cinema Kudeka foi paulatinamente decaindo, embora mais tarde tivessem sido feitas manobras e tentativas de salvaguardar a infra-estrutura através da realização de diversos eventos culturais para que a sua gestão fosse rentável.
Na década de 2000 a casa já não estava a render praticamente nada,
facto que fez com que os sócios procedessem a venda do imóvel, para o desagrado
de todos nós tetenses. A mana Luísa Dias Diogo tentou choramingar para ver se
haveria compaixão para que aquele lindo monumento cultural e histórico não
fosse deixado terra abaixo. Havia e ainda há na Cidade de Tete muitos outros
locais onde os investidores poderiam construir o que queriam faziam naquele
local.
Cerca de dois anos após o anúncio da venda, o Cinema Kudeka, por estar bem localizado, com a fachada principal virada para o nascer do sol e com o recinto tendo uma esplêndida vista para o rio Zambeze e para a Ponte Samora Machel, apareceu aquele desgraçado de um grupo hoteleiro que se prontificou a comprar a infra-estrutura.
O diabólico grupo de hoteleiros cismou que, precisamente aquele local onde se impunha imponente o Cinema Kudeka, era o mais apropriado para dar lugar a edificação de um hotel de 5 estrelas. Foi daí então que se matou, mais uma vez, o orgulho dos tetenses depois de derrubarem, sem dó nem piedade, o símbolo HOTEL ZAMBEZE.
Carlos Matos, um dos funcionários da empresa FM-transportes, a empreiteira que se encarregou de assassinar a história da nossa cultura, destruiu o badalado Cine Esplanada Kudeka para dar lugar às obras do Hotel VIP, construído pela empresa portuguesa Soares da Costa em 18 meses.
O mano Isaías Marrão, um dos sócios administradores de Cine Esplanada Kudeka, disse na altura que, nos últimos anos e após 14 anos de nacionalização pelo Governo moçambicano, o edifício já não lograva quase nada, uma vez que com o aparecimento de estações televisivas, o cinema começou a perder graça e deixou de ser uma actividade rentável.
Referir que ideia-prima da construção de um Cine Esplanada na cidade de Tete, para oferecer momentos especiais de lazer aos citadinos e motivo de estar ao ar livre junto ao Rio Zambeze para atenuar o intenso calor que, foi pertença de um empresário ligado ao Vaticano e que tinha casas de cinemas em Angola e em Moçambique.
Nos meados da década 70 lembrou-se então de fazer em Tete o Cinema Kudeka semelhante ao construído em Luanda. Convidou várias personalidades de Tete, incluindo Isaías Marrão, para idealizar o projecto e assim foi construído o Cinema Kudeca num espaço de tempo recorde, cerca de um ano, de Maio de 1974 até um pouco antes da Independência Nacional.
Após a sua nacionalização pelo Governo, a Sociedade de Kudeka extinguiu-se com a venda das acções do Cine Esplanda Kudeka ao Governo, tendo sido entregue ao Instituto Nacional de Cinema e Audiovisuais que enviou dois indivíduos a Tete para receberem as chaves do Cinema Kudeka das mãos de Isaías Marrão.
Já em meados da década 90 com o surgimento das cadeias televisivas no país, o cinema de 35 mm começou aos poucos a desaparecer, sobretudo nas pequenas cidades, e a casa começou a não render, situação que levou a Isaías Marrão como sócio maioritário depois de comprar todas as acções dos outros sócios, a organizar a documentação para a venda do recinto ao Grupo Hotel VIP para a construção daquele hotel de 5 estrelas, o único até então na Cidade de Tete que estava a registar um franco crescimento e desenvolvimento sócio económico, se não fossem as dívidas ocultas e a pandemia da COVID-19.
Após a destruição do Cine Esplanada Kudeka as cercas de 720 cadeiras de madeira da primeira, com estruturas metálicas, foram oferecidas ao Conselho Municipal da Cidade de Tete, para serem usadas como bancos nos parques infantis e jardins em reconstrução na Cidade de Tete, sem que eu possa testemunhar, tal como muitos citadinos de Tete.
É assim e neste contexto que grupos de hoteleiros espedaçaram a nossa história cultural e os munícipes de Tete, incrédulos, assistiram a destruição daquela emblemática casa de diversão e cultura que marcou a nossa Geração de Ferro.
Até então o Cinema Kudeca era o único estabelecimento de cinema ao ar livre em Moçambique com mais de 700 lugares para espectadores. Aquele recinto proporcionou muita alegria e momentos memoráveis a muitos tetenses.
Indignados com o doloso destino do Cine Esplanada Kudeka, um grupo de tetenses produziu e fez circular o seguinte abaixo-assinado debalde, porque nada valeu:
“ABAIXO-ASSINADO EM DEFESA DO CINEMA KUDEKA
Ao Excelentíssimo Senhor Presidente da Fundação Aga Khan
Ao Excelentíssimo Senhor Presidente do Concelho Municipal de Tete
Ao Excelentíssimo Senhor Ministro da Educação e Cultura
Ao Excelentíssimo Senhor Ministro do Turismo
Os abaixo-assinados, naturais, amigos e simpatizantes de Tete e, principalmente, defensores do património cultural de Moçambique, tomaram conhecimento, com muita indignação, da intenção do grupo Aga Khan de demolir o cinema Kudeka, na Cidade de Tete, para no seu lugar erguer um hotel.
Permitam-nos recordar aos Ex.mos senhores que o cinema Kudeka é um edifício de dimensão e formato únicos em todo o País, e que o mesmo possui valor histórico, não só para Tete, mas também para Moçambique.
Tal como o nome diz, Kudeka significa bonito, belo!
Ao destruir um monumento deste porte não só estarão a eliminar parte da história e da tradição do país e, principalmente, da Província de Tete, mas também a destruir parte dos valores culturais e tradicionais da população.
O Cinema Kudeka não constitui apenas património arquitectónico da cidade, mas do povo.
Congratulamo-nos com a construção de um hotel da categoria do que se pretende implantar onde agora está o Kudeka, mas a Cidade de Tete possui outros terrenos onde o grupo Aga Khan poderá erguer esse empreendimento.
Por isso vimos por meio desta pedir que:
POR FAVOR, NÃO DESTRUAM O CINEMA KUDEKA
Maputo, 29 de Maio de 2007
VALORIZEMOS O PATRIMÓNIO HISTÓRICO E CULTURAL DE MOÇAMBIQUE”.
Ode a Cidade de Tete e eterna saudade do nosso Cinema Kudeka.
Kudeka é beleza e é orgulho Manyungwe!
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