A FRELIMO TEM SIDO UMA GRANDE DECEPÇÃO
(João Pereira, In:
Savana, 13 de Abril de 2018)
Por: RM Kuyeri, 16 de
Abril de 2018
É muito triste que a gesta Geração
de 25 de Setembro de 1964 tenhas chegado a onde chegou... Quase que ao fim, por
culpa própria. Nada de alegar a “Mão Invisível”.
Os que nos esperam as Eleições
Autárquicas desde ano e as Eleições Gerais e Provinciais de 15 de Outubro de
2019 é um cenário sombrio e desolador. Parece que o Partidão não futuro,
enquanto o Partido Frelimo não se rever e já vai contra o tempo.
Não sei se desta vez o slogan “A
Vitória Organiza-se, A Vitória Prepara-se” vai vingar. Reservo as minhas
dúvidas ao que se segue, de uma análise de um politólogo nacional, da minha
triste geração e colega de faculdade. Sobre o que ele diz, não tenho dúvidas.
Duvide quem assim lhe convier.
Nesta semana (09 a 15 de Abril de
2018), em que o partido no poder lançou as comemorações dos 50 anos do II
Congresso, cujo ponto mais alto será a 25 de Junho próximo, na localidade de
Matchedje, distrito de Sanga, no Niassa, o SAVANA foi entrevistar o docente de
ciência política, João Pereira, para uma leitura pontual sobre a Frelimo de
hoje.
Para Pereira, 50 anos depois do II
Congresso da Frelimo, a única memória positiva é o facto de ser o movimento que
libertou o país. É que, disse, a Frelimo tem sido, sobretudo nos últimos 25
anos, uma grande decepção. “Decepção porque grande parte da elite política da
Frelimo perdeu os seus valores como ética, integridade e solidariedade com o
povo. Hoje, a Frelimo e os seus dirigentes parecem mais máquinas de acumulação
primitiva de capital do que servidores dos interesses mais nobres do povo
moçambicano”, precisou o académico, para quem “a Frelimo moralista,
galvanizadora ou agente transformador da sociedade, deixou de existir”.
Entende João Pereira que, como
partido, a Frelimo está num estado de degradação e a seguir um caminho que não
representa aqueles que foram os seus grandes e nobres valores, o que é muito
triste ver, um partido desta dimensão neste estado por causa da ganância. “Deve
ser muito penoso para aqueles que são os saudosistas da era da purificação das
fileiras na Frelimo.
Deve ser muito doloroso para um
Jorge Rebelo, para certas figuras da Frelimo, para milhares de antigos
combatentes sem benefícios, quando 10 ou 15 famílias da Frelimo é que têm força
suficiente para beneficiar de tudo; deve ser muito penoso para eles porque não
foi isso que lhes levou a lutar”, comentou João Pereira.
João Pereira afirma que os moralistas
de ontem são os grandes lobistas de hoje.
“Nacionalizaram grande parte do que era propriedade privada dos colonos
para eles se tornarem os novos proprietários. Nacionalizaram grande parte das
fábricas para hoje se tornarem os grandes proprietários das fábricas, mas com a
única característica de que as fábricas deles já não produzem nem criam riqueza
para o país.
Grande parte da nossa nova média e
alta burguesia, surgida daquela elite que tanto defendia o campo, a zona rural,
a transformação do campo, hoje simplesmente são lobistas e vivem do lobby”, sublinha João Pereira,
repudiando que “não é essa a Frelimo que nós os moçambicanos sonhávamos”.
João Pereira diz que o partido
perdeu os princípios no processo da liberalização da economia, em finais da
década de 80 e início da década de 90. “A morte do Presidente Samora Machel, a
saída dentro da esfera do poder de algumas figuras emblemáticas que deixaram de
ter o seu peso na estrutura do partido, a entrada duma geração mais virada à
ganância, ao controlo do poder, ao controlo económico, ao roubo, ao saque, a
fragilidade das instituições de justiça, que foi feita de propósito para
facilitar essa ganância toda, então, chegou a uma altura em que elas próprias,
as lideranças, perderam o controlo”, disse João Pereira.
Para João Pereira (e muitos outros
moçambicanos), as ligações com o grande lobby
internacional de tráfico de influências, das negociatas, do enriquecimento
ilícito, tudo isso fez com que grande parte das elites da Frelimo perdesse o
seu norte. “A partir da década de 90 começámos a ver a degradação da própria
Frelimo. Até certos sectores da liderança da Frelimo diziam até que o “cabrito
come onde está amarrado”, só faltou dizer que quanto maior for a corda, melhor
e porque o raio de acção e da comida é maior. Quer dizer, quando você chega a
este extremo, mostra claramente que já não havia outra saída a não ser cabrito
e esperar que em volta houvesse mais capim para comer”, comentou João Pereira.
Questionado se a Frelimo vai ou não
a tempo de recuperar os seus princípios, João Pereira foi peremptório em afirmar
que não acredita, porquanto grande parte das pessoas honestas, que têm valores
e que podiam ser elementos transformadores dentro da estrutura do partido, ou
estão marginalizadas ou desligaram-se do partido para evitar chatices.
João Pereira anotou também que, ao
nível da Frelimo, não existe uma predisposição de ir buscar esses elementos e
trazê-los voltar para o seio do partido ou, se existe, é simplesmente para
acomodá-los, mas não lhes dar espaço de transformação. “Mesmo se existir esse
indivíduo vai ser um pastor sem seguidor, porque grande parte da actual elite
política da Frelimo sobrevive a partir de redes clientelistas, do roubo, da
reprodução de influências, do gangsterismo. Tudo o que é mais nefasto hoje na
sociedade é encontrado dentro do partido Frelimo também”, remata João Pereira.
João Pereira vinca que a situação é
tão grave que, se alguém aparecer no partido a pregar valores, não terá
seguidores. “Até vai ser zombado, dizendo que ‘esse velhote está caduco’, como
o fazem com Jorge Rebelo, que dizem que ‘está cansado o velho’. É como você
criar uma igreja e você sozinho entrar com a bíblia querer pregar evangelho,
mas ninguém está para lhe seguir, nem para aplaudir, então, você vai ficar
isolado”, metaforizou João Pereira.
João Pereira lembra que antes havia
um mecanismo de casting para a
entrada nas fileiras da Frelimo e lamenta que hoje qualquer indivíduo, seja ele
ladrão ou não, ingressa no partido sem passar por nenhum crivo. João Pereira
(como muitos outros) não tem esperança de que o partido recupere os seus
valores nobres, pelo menos, nos próximos anos. “Os valores da ganância estão
sendo transmitidos dos antigos fundadores que se tornaram em grandes burgueses
a partir da captura do Estado e da sua própria reprodução e desenvolvimento da
rede clientelista, estão a ensinar até aos seus próprios filhos que aquele é que
é o caminho e não estão a resgatar os valores da Frelimo”, lamenta João Pereira,
que vê uma Frelimo moribunda e sem coragem de se tornar naquela força
aglutinadora que já foi.
João Pereira diz que, o mais grave,
é que esse é o legado que a Frelimo vai deixar, o facto de ser o partido que
espalhou corrupção na sociedade inteira.
Isto é motivo para se dizer: Quo vadis Moçambique!
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