NOITES PORNOGRÁFICAS DE MAPUTO
RM Kuyeri

A crise económica em Maputo veio associada à crise de valores e do pudor, que já nem se respeita os lugares de culto e cemitérios. Nas igrejas e cemitérios as silhuetas femininas se esgrimem em variados argumentos nas suas vestes para provar quem apresenta melhores curvaturas e quem é a melhor obra-prima do escultor Chissano. Mas o pior dia da semana em Maputo é a sexta-feira, das 19:00 às 05:00 horas do sábado. Perguntem a qualquer vivalma lá no Bairro Alto-Maé, onde o centro de orgias, guisadas aos tiros do tipo cinema farwest, é comum na Discoteca Madjedje.

Há muito que Maputo deixou de ser a Cidade das Acácias para passar a ser Cidade Pornográfica. As acácias, estas, há muito que secaram com o xixi de homens e mulheres, que nem se envergonham, em pleno sol, para exibirem as suas partes privadas e desfazerem-se das suas necessidades de aliviarem as suas bexigas.

Há quem ironicamente disse que a Cidade das Acácias se foi com o colono e hoje as poucas acácias que ainda teimam em resistir a ureia do xixi humano são tão sofridas quanto o seu povo escravizado pelas badaladas dívidas ocultas do regime do “Tio Pato” e da “Tia Patinhas do Natal”. O mais importante é que, mesmo assim, a cidade continua sendo deles, pertence-lhes, não obstante as suas raízes testemunharem a história deste povo sofrido durante séculos.

Às sextas-feiras, o chamado “Dia-dos-Homens”, que não deixa de ser também “Dia-das-Mulheres-Nocturnas”, as ruas da cidade de Maputo encontram-se engravidadas de múmias andantes, preocupadas em abandonarem os seus sepulcros, lá nos bairros de lata da Mafalala e Xipamanine ou Magoanine, para chegarem à “Rua Araújo”, aliás, a revolucionariamente chamada “Rua Bagamoyo”.

Automóveis buzinando e cada um com a sua discoteca psicadélica ambulante a trovar sons bizarros. Estremecem-se os velhos e cansados edifícios com esgotos rebentados à medida que estas discotecas passam. Cobradores de “Chapa 100” gritam até ensurdecerem os tímpanos no limiar da sua faina. Os vulgos Txopelas serpenteiam entre as vagas de viaturas, que nem autênticas minhocas a saírem e entrarem na cidade cimento.

Os policiais branquinhos e cinzentinhos vão fazendo as suas horas-extras para financiarem o seu fim-de-semana. A esta hora eles não estão ali para cumprirem o seu dever de manter a propalada Lei & Ordem. Mas a fauna zaragateira não está nem por ai. Vai soltando os meticais. Cada policial vai amealhando à sua sorte pelas ruas, já lá vão na sexta ou décima segunda “caixa de refresco” gritando: “Eh, wena! Txela ka mina, famba! Andi djule madokumento ya wena, ndidjula mali mina. Txela kola, kaphaketini!” (Eh, você! Passa cá e vá embora! Não quero os seus documentos, quero dinheiro. Põe aqui no bolso!).

Jovens estudantes, algumas ainda uniformizadas, descem em direcção à baixa da cidade onde se desfazem dos uniformes e ficam de roupas miúdas, quebrando recordes de alcoólatras, num ritual de “uma rodada chama a outra…”; um tiro ou mais troa e nenhum vulto se preocupa, porque todos sabem que são “os bradas” cinzentinhos a darem sinal da sua presença na área… vão se firmando por detrás de cigarros ou da chamada erva da paz comprada na Zona Militar. Todos vão exalando fumo pela boca, narinas e ouvidos que nem chaminés; espalha-se um nevoeiro de fumo pelo ar, à mistura do fedor da catinga e da urina nos muros e nas acácias das avenidas 24 de Julho e Karl Max. Dizem que Maputo agora é KaMpfumu, com a sua poluição ambiental. É o regresso às origens históricas, mas sem ética nem moral.

Mas a noite ainda é miúda. A partir das 23:00 horas, começa um movimento para a cidade alta que desagua na discoteca Madjedje, entre risadas despidas das mulheres da má vida e seus sacrílegos. Trata-se de sacrílegos que fazem o país andar a passo de camaleão, mas, de todas as formas, tem de andar. É esta a nossa terra do “Txova xita duma” (Empurre que vai pegar), o hino da Pérola do Índico, entoado euforicamente com alguns passos de dança em todas as esquinas dos quarteirões.

Homens e mulheres de todas as idades agarram-se e esfregam-se uns contra outros; retiram a vergonha da cara e a guardam ocultamente nas bolsas e nos bolsos. Ingere-se tragos à gargalo, ao sabor de uma Preta, 2M e tantas outras marcas estrangeiras que não me atrevo a passar publicidade… meia volta, os efeitos secundários evaporam e se confundem no fedor dos sovacos e dos fios-dentais.

Gente apinhada e automóveis entre as ruas, uns a quebrarem os amortecedores de vuku-vuku da Mulher Melancia de Moz… A noite vai se desfazendo em câmara lenta e ao passo do serviço público maputense. As 05:00 horas de cada sábado as paragens ficam repletas do resto das múmias da noite anterior, os chapas ficam lotados, uma e outra moça chora pelo seu telemóvel. É que os meninos do alheio aproveitam da ocasião para se fazerem ladrões e grampeiam uma e outra presa que aparenta sonolenta de tanto cansaço nocturno: são vítimas preferidas dos chamados “gwadjisas” ou akambowa, na minha língua Cinyungwe (bandidos).

É que às noites de sexta-feira a cidade de Maputo toma a fisionomia dos Deuses gregos, onde os incautos maridos são apanhados com a boca na botija pelas esposas a apalpar as intimidades das garotas da madrugada do sábado, quando as quarentonas descansam de baboseiras das noites de álcool e promiscuidade em plena rua, quando já não se prestam a socorrerem-se das esquinas dos guardas e parques de automóveis para as suas orgias lucubres sobre papelões.

Os madalas, que regressam da sua faina de pescaria, passam pelas mesmas ruas onde saciam a sua sede de olhares gulosos e tratam simplesmente de travar a sua majestosa máquina de pêndulo entre as coxas, para depois partirem para briga entre o desejo e a preservação do seu pudor. Ao redor contabilizam-se farpas de tissagens no chão. Um dos madalas implora aos Deuses gregos por mais dedos da mão para que possa atenuar os golpes valentes do musculoso pêndulo entre as coxas e que insiste em romper com a barreira da braguilha dos seus vestes, ao ver a senhora sua esposa estatelada e com as partes à vista. Finge que não a viu. Algum vizinho está por ali presente e o reconhece. Ele segue a moda dos jovens maputenses, como tantos outros que vão seguindo a moda e apenas limitam-se a tirar fotos nos seus telemóveis para postarem no Facebook ou WhatsApp.

Falem a sério maputenses. Esta é a vossa radiografia, cuja vergonha só se liberta após o sonambular do sol da manhã de domingo, para depois culpar os dissabores da noite anterior, devido a más companhias, quando se revêem em lugares onde o chão é mais limpo e passam algumas garotas, todas txunadas (elegantes), a dirigirem-se para o mercado, cemitério ou igreja, sem se distinguir quem é quem, só pela aparência, porque qualquer mamparra (malandro) usa fato para a missa dominical. Não finjam serem de KaMpfumu, porque vós sois maputenses, que vagueiam nas noites sem beira nem eira.

Na cidade de Maputo gente normal não se distingue dos chamados gigolôs, todos eles encobertos por uma indumentária respeitável, mas as verdadeiras intenções da gigoloagem revelam-se assim que as silhuetas das mamanas do mercado Xipamanine lhe espreitam de esguelha ao volante de Marranje-Rovas, como aquelas que ofereceram ao Mr. Bow para o privar do seu Xitsungu, ao sabor da inveja de ZiQo. Mas cuidado que as silhuetas destas mamanas do mercado de Xipamanine têm seus militantes que abrem as bocas de lés-a-lés para a fofoca no Facebook, ou mesmo nas câmaras da TV. Perguntem ao Yuram que reivindica a traição da Mulher Melancia de Moz que serviu chá de calcinha ao seu marido para não se importar pelas suas traições. Só que o garoto Yuram ainda não tomou tal chá da calcinha e anda ai com o Fred a lançar farpas.

Enquanto isso, lá vão os doutores discutindo o estado da nação e criticam tudo e todos, como se eles não fizessem parte da fauna de maputenses. É que em Moçambique quem tiver licenciatura é doutor, dai o termo ser tão frequente quanto o cobrador de “Chapa 100”, via Xikelene – Anjo-Voador. Vão-se servindo petiscos cabeçadas de boi e não de vaca nas barracas onde matam babalaza e as relações públicas são mais eficazes. Aqui entram no Guiness Book as barracas do Museu, porque as de Mandela já eram. Construiu-se lá um mercado fechado.

O que importa é a paulada da bebedeira que esgota os preservativos nas prateleiras para uma curtição com a meninada de rua. É que, quando as prostitutas estão bem grossas, a tabela do serviço prestado é mais baixa e, as vezes, se cedem a borla, porque já não sabem o que fazem. Nisso acontecem as variadas formas eróticas em algum lugar desses prédios cansados, enquanto outros empacotam as suas presas e partem em autênticas competições automobilistas da fórmula 1 pelas avenidas, rumo à marginal, onde está sempre a bater lá na Rua Bagamoyo.

Os fofinhos das barracas e da noite de segunda à sexta-feira, porque o sábado é para as compras e o domingo para missa, não se preocupam com o combustível que maltrata os bolsos do pacato cidadão moçambicano, porque os pais deles que são Ministros ou directorizinhos que têm o saco-azul como aquele da dona do FDA, que não me atrevo a citar nome para não ser processado. A sua empreitada de corrupção “paga tudo o que é merda, porque o que importa é curtir”. É que, para alguma rapaziada de Maputo, todos os meses são Dezembro e servem para show-offs das suas super-máquinas turbinadas e com um colman cheio de gelo e bebida diversa na bagageira.

Este é Maputo do dia-a-dia, à excepção da sexta-feira, Dia do Homem, onde brigas não faltam e os pugilistas não têm ringue nem observam regras do jogo. Os actores são puros zaragateiros, halterofilistas, frequentadores assíduos de ginásios de fitness.

Volta e meia, surge outro Valente pugilista no meio de dois jovens que vão trocando habilidades das ruas pela disputa de um pedaço de carne, aquela menina meiga sem cérebro. É que, na cidade de Maputo, os cornos ganharam um hino e os provocadores conhecem-no, porque bomba em honra dos chifrudos e chifrados. Uma voz ouve-se: “Sabota lá essa cena, pá!” e o tempo vai passando. São 05:00 horas. Já não se sabe se segunda, quarta-feira ou sábado. Não se nota cansaço na cara destes jovens, apenas se vê tesão segurando as calças pela frente, enquanto as nádegas estão de fora, mostrando aquele bikini branco bem encardido, porque desde que foi tirado do fardo de roupa usada nunca conheceu água. Vão vagueando a vontade e sedentos de continuarem no txilingue. Quando surpreendem uma presa, não importa se são dois, três ou cinco. Todos partem para a partilha da “dama de ocasião”.

Rodopiam as rodas com jantes cromadas, assobiam os escapes e lá se vai a malta do txilingue da cidade de Maputo. Mas por ironia do destino, embatem violentamente em algum poste no entroncamento da Av. 24 de Julho com qualquer outra avenida ou rua. O condutor perde a vida de imediato, para não explicar as circunstâncias do acidente. Mas feliz de tanta curtição. Todo o álcool se vai pela cabeça dos restantes cinco acompanhantes que nem sentem os ferimentos contraídos. Álcool jorra dos seus olhos como lágrimas quentes a molharem os rostos que há minuto atrás estavam radiantes. Agora estão anestesiados de tanta adrenalina. Um a um vão dando o último suspiro… tão jovens estes moços e moças que deixam suas mães desfilhadas.

Algumas almas passam pelo local do majestoso sinistro, indiferentes ao caso. São sete horas e a vida já se iniciou, há quem tenha de lutar pelo seu pão. Enquanto isso, lágrimas vão inundando a alma de multidões comovidas e o dia segue o seu rumo, tal e qual como o Santo Deus o determinou.

Um transeunte perplexo exclama: Mas esta gente não vinha vestida! Onde é que estão as roupas destas menininhas? Outro responde: Ficaram por cima dos umbigos. Não vês aqueles trapos ali entre o umbigo e as tetinhas! Ambos concluem: Formalmente o nosso país não produz filmes pornográficos, mas Maputo produz. É só ver neste resto de gente ai nua. Como esta gente ousou andar de carro sem roupa! Mas um desses aparelhos Samussung S7 caído entre os pés de um dos malogrados está a rodar cenas das suas orgias sexuais antes do acidente. A gravação do acto sexual fica exposto ao público e os mirones já não se preocupam pelos sinistrados, porque ocupados em assistir as cenas de pornografia na pequena tela do Andróide. Há no meio quem grita: Isto é escândalo nacional! Como se a cidade de Maputo fosse à dimensão de Moçambique.

Mas quem não sabe que, com apenas alguns cliques no seu celular, qualquer moçambicano consegue ter acesso aos mais variados tipos de pornografia, seja por influência ou inspiração. É que os moçambicanos ganharam gosto pela pornografia desde circularam no Facebook aquelas “cenas do ZiQo e daquele cota do INGC nas bandas do Chiveve, familiar do Peixe-Seco, aliás, Pacheco.

Mas fora destes isolados casos, existem milhares de vídeos pornográficos caseiros nos telemóveis e câmaras digitais de muitos citadinos de Maputo. Muitas pessoas dizem que gravam os seus actos sexuais para manter como recordação, outros querem exibir a amigos para mostrarem quanto txilam e quanto são homens de verdade. Enfim, não importa o motivo, o facto é que a pornografia na cidade de Maputo está a bater.

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